quarta-feira, janeiro 30, 2013

12 Angry Men


"12 Angry Men" é um daqueles filmes que mal o terminamos de ver, apetece-nos imediatamente ir a correr até à nossa lista de filmes favoritos, para o adicionar à mesma.

Trata-se de uma obra impressionante que decorre quase exclusivamente numa sala com 12 pessoas. Os 12 em questão encontram-se a discutir um caso de homicídio e têm a árdua tarefa de dar a liberdade ou a "cadeira" (não há outra opção aqui) ao réu. O caso parece de resolução bastante simples ou não entrassem na sala os jurados a falarem como se já estivesse tudo decidido. Todos, excepto um, aquele que é interpretado por um carismático Henry Fonda (excelente prestação) e o primeiro a mostrar-se hesitante em tomar uma decisão de vida ou morte em tão poucos segundos.

O que parecia algo simples, desenvolve-se num  pormenorizado estudo criminal, onde as personalidades dos jurados se vão revelando ao longo do tempo. Os ânimos tornam-se por vezes demasiado acesos e aqui o excessivo calor não ajudou, um calor sempre bem presente e vincado ao longo do filme.

A decisão do júri no tribunal americano, não é tão abordada na ficção como os célebres duelos entre os advogados durante um julgamento, por isso "12 Angry Men" é também uma proposta fora do comum, e que nos mostra esse outro lado de uma forma exemplar. É também um daqueles casos em que com tão pouco se faz tanto.

Aquele final - de certa forma uma intervenção - fecham esta história de forma sublime. Todo aquele entregar final de Lee J. Cobb é a conclusão derradeira para um dos melhores dramas que vi. Com argumento de Reginald Rose é mais uma pérola realizada por Sidney Lumet.

terça-feira, janeiro 29, 2013

Django Unchained


Gosto muito de Quentin Tarantino, a sua paixão pelo Cinema é contagiante. Gosto da sua noção de estética, da sua irreverência e da forma como filma. Mas, mais ainda, gosto da sua escrita, dos seus diálogos e das suas personagens.

Focando-me por exemplo em alguns dos seus últimos filmes, há determinadas cenas em particular, onde o realizador envereda por determinados aspectos da nossa cultura (popular ou não) que são absolutamente divinais. Relembremos o monólogo de Bill (David Carradine) em "Kill Bill 2" sobre o Super-Homem, a fim de provar um determinado ponto de vista, ou, no seu projecto anterior "Inglorious Basterds", aquela mítica cena em que o Major Hellstrom (August Diehl) descobre ter o papel do King Kong e desvendar os infiltrados pelo simples - mas denunciador - pormenor do Lt. Archie Hicox (Michael Fassbender) a fazer o número 3 com a mão.


[SPOILERS]


Em "Django Unchained" temos mais uma destas pérolas, quando o Dr. King Schultz (Christoph Waltz) se encontra a sufocar emocionalmente ao recordar a morte de um escravo por cães. Neste momento Schultz levanta-se interrompendo a música - não era a altura para se ouvir o seu conterrâneo Beethoven - e dirige-se à biblioteca. Aqui segue a conversa sobre o autor Alexandre Dumas e as suas respectivas raízes (o seu avô havia casado com uma escrava de origem Afro-caribenha). Uma conversa que tem origem no facto do escravo que Schultz recordava se chamar D'Artagnan. É uma das melhores cenas do filme, com um Christoph Waltz e um Leonardo DiCaprio nos seus melhores níveis. Apesar de ser um caçador de prémios implacável Schultz é um idealista, um lutador pelos direitos humanos e que, felizmente, não viverá para assistir aos massacres que haveriam de decorrer na sua terra Natal.

Gostei do Jamie Foxx e de todo o conceito do seu Django, - um escravo a vingar-se dos esclavagistas, o que há para não gostar? - bem como da sua luta pela mulher que ama. Mas, para ser sincero, todo o filme pende mais para as excelentes interpretações secundárias. Os já mencionados Waltz e DiCaprio, sempre que se encontram juntos adicionam uma carga extra de tensão a todo o filme criando um anti-herói e vilão dignos de perdurar na história. Mais tarde junta-se a eles Samuel L. Jackson no papel de Stephen o governante de Calvin Candie (DiCaprio) em mais uma interpretação magistral, os maneirismos e olhares de Stephen são tão reais que por momentos cremos que o actor nos deixou e que tudo que ficou foi a sua personagem, certamente uma das mais amargas que já interpretou. Nisto tudo ainda há tempo para uma perninha do grande Don Johnson.


Depois temos as influências cinematográficas de Tarantino, que são tantas que não devo ter apanhado metade. Ainda assim é de referir a sua admiração pelos Westerns e pelos filmes de Blaxploitation. E já agora o cameo de Franco Nero também foi bem bonito. Toda esta mistura de estilos gerou um filme muito diversificado, o que poderá não agradar a todos,  veja-se por exemplo a cena cómica com os Regulators (pré-KKK), tão diferente do resto do tom do filme, mas tão hilariante na mesma. A própria banda sonora junta Ennio Morricone e 2Pac, passando por outros compositores. Talvez, muitos estranhem o uso de Hip-hop num Western, mas isto é Tarantino e de tradicional só mesmo as homenagens.

sexta-feira, janeiro 25, 2013

Tabu


Mais que um dos melhores filmes nacionais de 2012, “Tabu” de Miguel Gomes tem recebido inúmeros elogios e distinções como um dos melhores filmes desse ano, ponto.

Finalmente - graças à reposição nos cinemas Nimas – consegui assistir ao filme em questão e resta-me apenas dizer que os elogios são merecidos. “Tabu” é belo, divertido e apaixonante. Tem vários ingredientes que adoro num filme e que são aqui misturados de forma exemplar.

O filme divide-se em duas partes, a primeira “Paraíso Perdido” mostra-nos a história de Pilar e da sua vizinha Aurora (excelentes Teresa Madruga e Laura Soveral), uma idosa viciada no jogo cuja sanidade mental lentamente a começa a abandonar. Nesta história faz-se a ponte para a segunda parte, “Paraíso” onde voltamos atrás no tempo para conhecer a juventude de Aurora (a bela Ana Moreira) e o amor impossível que viveu algures numa colónia em África.

As opções estéticas poderão também fazer as delícias dos cinéfilos, há todo um tom clássico a evocar o cinema antigo tendo sido filmado em película de 16mm. A segunda parte, por exemplo, é contada exclusivamente através de um narrador e com as belas paisagens africanas (Angola?) como pano de fundo. Aqui os actores nunca se ouvem, mas não é por isso que as suas emoções se sentem menos. Nesta segunda parte “Tabu” é um poema às paixões proibidas e um que merecer ser lido várias vezes.

E, como se fosse preciso mais, ainda há crocodilos!

quinta-feira, janeiro 24, 2013

The Legend of Luther Strode #1


Nas encomendas de Janeiro veio-me o primeiro número deste "The Legend of Luther Strode", sequela directa do já falado por aqui "The Strange Talent of Luther Strode". Novamente a série vai contar com seis comics.

Neste primeiro número, gostei do facto de não abordarem directamente a personagem do Luther Strode, se antes o seguíamos enquanto protagonista, neste primeiro capítulo apenas temos vislumbres da sua pessoa, sabemos que existe e quando irá agir, mas o que se passa dentro do seu coração é mais imaginado do que revelado directamente, se bem que tendo em conta os acontecimentos passados uma coisa é certa, o local em que o coração de Luther Strode se encontra de momento é um muito negro.

Desde os acontecimentos passados que Strode tem continuado a sua missão em limpar as ruas da sua cidade - limpar aqui será puramente metafórico, pois tecnicamente Strode suja as ruas da cidade com o sangue e pedaços de órgãos dos criminosos. Os seus feitos monstruosos espalham-se por entre a comunidade criminosa gerando uma lenda à sua volta.

A partir desta primeira amostra, "The Legend of Luther Strode" promete ser ainda mais violento e visceral que o seu anterior e sendo eu, tal como Alex DeLarge, um apreciador da ultra-violência (na ficção pois claro) mal posso aguardar pelos próximos.

De salientar que esta história de Justin Jordan encontra nos desenhos de Tradd Moore e na cor de Felipe Sobreiro a dimensão que precisa e merece. Graficamente é um prazer para os olhos, mas volto a relembrar que a violência é gráfica e encontra-se em doses massivas.

A Image Comics continua a lançar material muito interessante na indústria norte-americana reforçando que é um nome ao qual estar muito atento.

quarta-feira, janeiro 23, 2013

O novo brinquedo


Aqui está ele, a melhor prenda de Natal de 2012, um sonho antigo, mas que havia caído um pouco no esquecimento por mim. Finalmente, um prato para ler discos de Vinil. Começo a enveredar por este caminho muito bem ao som de Chet Baker e Art Pepper, um disco que havia oferecido e qual boomerang me voltou a parar às mãos (a pessoa em questão tem o leitor avariado).

Como se já não tivesse coisas suficientes em que gastar dinheiro (raio do consumismo) agora junta-se à lista isto. Bem, corta-se nos CD's, até porque o meu laser está, infelizmente, a falecer (mas com o PC ligado à aparelhagem é problema que se contorna).

E pronto, agora vou colocar a tocar o primeiro LP que comprei (há minutos atrás), ora vejam lá se conseguem adivinhar qual é:


...brincadeira, aqui está ele:

terça-feira, janeiro 22, 2013

Heath Ledger


O Livro da Selva


Estou no final de 2008 a ler "The Graveyard Book" de Neil Gaiman, uma divertida história sobre um rapaz criado por fantasmas e educado por um vampiro e uma lobisomem. Trata-se de uma clara homenagem ao clássico de Rudyard Kipling, "The Jungle Book". Acho que é Gaiman que diz no posfácio do livro, que "O Livro da Selva" é um daqueles livros que todas as crianças deviam ler. Infelizmente, não foi o meu caso, em miúdo lia maioritariamente, ou quase exclusivamente BD, e a maioria destes clássicos passou-me ao lado. Decidi instantaneamente em corrigir isso, no que toca à obra de Kipling. Olho agora para a data do post que fiz na altura e vejo que já se passaram quatro anos, foi uma resolução que se foi atrasando, mas, felizmente, que não foi esquecida.

Li a edição da Tinta da China, pertencente a uma colecção que já tinha mencionado aqui. são edições bastante bonitas e cuidadas, que contam todas com ilustrações. Até à data penso já a ter completado.

Logo ao abrir o livro, apercebo-me de duas coisas que desconhecia, a primeira é de que "O Livro da Selva" não se trata de uma história, mas antes de vários contos. Além disso, os contos não se prendem todos com as aventuras de Mogli, pois este só está presente em cerca de metade do livro, logo nos três primeiros contos.

A história de Mogli é amplamente conhecida, onde para isso muito contribuiu a versão animada de Walt Disney. As aventuras de um rapaz adoptado pela selva espalharam-se pelo mundo fazendo sonhar tanto miúdos como graúdos. Penso que será justo dizer que Mogli é uma clara fonte de inspiração para "Tarzan" de  Edgar Rice Burroughs, entre muitas outras obras.


Kipling começa por contar-nos a origem do bebé indiano que foi abandonado pelos pais após um ataque do terrível tigre coxo, Shere Khan. Graças à protecção de dois lobos e à intervenção do pantera Baguera e do urso Balu, Mogli seria salvo e posteriormente aceite pela alcateia Seeonee liderada por Akela. A fim de pertencer, ficaria a cargo da família de lobos que o encontrou e teria como mentores Balu e Baguera, que rapidamente se tornaram como irmãos.A sua entrada e posterior saída da alcateia são o foco deste primeiro conto que salta até aos 10 anos de idade de Mogli.

No segundo conto, volta-se atràs no tempo para contar o fatídico episódio em que Mogli foi raptado pelos lunáticos macacos e que contou com a introdução de mais um temível personagem, o cobra Kaa. Para a terceira e última a ventura, ficou guardado o iminente confronto entre Mogli e Shere Khan, que decorre após o final do primeiro conte. Nesta aventura o rapaz irá contar com a ajuda preciosa do seu irmão mais velho e de Akela. Neste último conto, o título foi retirado do famoso poema "The Tyger" de William Blake.


É claro ao chegarmos ao final desta narrativa, que existem mais aventuras de Mogli, é citado pelo próprio autor que a jovem criança irá casar no futuro, mas que essa é uma história para adultos. E de facto existe um "Livro da Selva 2" que traz mais peripécias de Mogli, outra descoberta, outra resolução. Espero que desta vez não passem mais quatro anos até lhe pôr a vista em cima.

É uma história especial a de Mogli, a aventura de um rapaz humano que encheu de amor os corações de uma família de lobos e dos seus dois protectores. Haverá animais mais fantásticos na ficção que Baguera, Balu e Akela?

Além de Mogli, seguem-se mais quatro contos. Começamos pela odisseia de Kotick, uma foca branca que procura por um paraíso para as focas, um local aonde nenhum Homem chegue. De seguida temos a célebre batalha numa casa-de-banho de Rikki-Tikki-Tavi, um mangusto irrequieto e corajoso, que protegerá um jardim e uma família dos terríveis ataques de duas cobras. Em "Toomai dos elefantes" o protagonismo regressa às crianças humanas, onde Toomai uma miúdo de 10 anos irá assistir a algo que poucos homens viram na sua vida, a lendária "dança dos elefantes". Por fim, temos ainda uma conversa animada entre vários animais pertencentes a um campo militar onde todos discutem sobre os seus respectivos papéis na batalha.

Em relação ao conto de Kotick, nota-se que o tradutor se trocou algumas vezes com o nome da mãe deste foca, ora chamando-lhe Matkah (o correcto), ora chamando-lhe Maktah. Com nomes destes, é fácil trocarmos-nos em algumas letras.


Todos os contos são precedidos e terminados por fantásticos versos, que mostram que os dotes do autor vão além da prosa. No final é impossível ficar indiferente a estes contos tão inspiradores e divertidos, onde a Índia - país em que o autor viveu os primeiros cinco anos de vida - teve um papel essencial para a sua existência. Há lições de moral a tirar de cada um, o que me faz reforçar a frase citada acima, "O Livro da Selva" devia ser lido por todas as crianças.

A título de curiosidade, foi um livro usado para inspirar o grupo de escuteiros dos Lobitos, onde o lobo Akela assumiu um papel preponderante, tornando-se o nome adoptado pelo líder do grupo.

Para as ilustrações, a editora foi buscar os trabalhos do alemão Kurt Wiese, um conhecido e aclamado ilustrador. Wiese chegou a ser prisoneiro dos ingleses durante cinco anos durante a 1º guerra mundial. Foi durante esse tempo que o contacto com a vida animal o voltaria a inspirar para desenhar. Além do "Livro da Selva", Wiese ilustrou também a história de "Bambi" e das "20.000 léguas submarinas", entre tantas outras.

domingo, janeiro 20, 2013

Fringe - Temporada I


Gostei bastante, com particular destaque para o Dr. Walter Bishop de John Noble. Uma série com um certo sabor a "X-Files" que tantas saudades havia deixado. É também uma piscina de ideias de ficção científica que vai entusiasmar todos os apreciadores.

Tenho ideia que no início Anna Torv não começou muito confortável como Olivia Dunham, mas como tal já não me parece, ou tenho má memória ou ela melhorou à medida que os episódios avançaram.

O final da primeira temporada foi muito bom com algumas surpresas pelo caminho. A dada altura percebe-se quem será o nome na sepultura que Walter visita (e é espectacular) e por fim gostei muito de ver o actor que interpreta William Bell.

Como todos dizem que isto ainda melhora muito, depois de uma boa primeira temporada só me resta passar para a segunda, ainda mais ansioso.

quinta-feira, janeiro 17, 2013

Les Misérables


"Les Misérables" de Tom Hooper, consiste na adaptação do musical - com o mesmo nome - com música de Claude-Michel Schönberg e letras de Alain Boublil e Jean-Marc Natel, e tradução para o inglês de Herbert Kretzmer. Musical por sua vez que é a adaptação do clássico da literatura de Victor Hugo. O facto de ainda hoje se fazerem adaptações desta história e de estarmos a falar dela é a mais viva prova da imortalidade que Victor Hugo conseguiu atingir. Com uma história destas e uma forte componente musical, Tom Hooper partia já com a facilidade de ter material de base de excelente qualidade.

Antes de mais é preciso realçar que desconhecia o musical. Sim conheço a "I've dreamed a Dream" e até a versão da Susan Boyle, mas nada mais, aliás o próprio género é dos que menos conheço no Cinema. Após a visualização do filme, fiquei rendido ao musical em si que tem sido a minha banda sonora diária, não só a do filme, mas a de dois espectáculos musicais, o de Londres com o elenco original e uma edição comemorativa de 25 anos. Talvez faça sentido sublinhar que o filme de Hooper é uma adaptação do musical, porque me parece, pelo que se escreveu, que algumas críticas não tiveram isso em consideração. Podemos sempre criticar Hooper pela escolha e por não se ter arriscado mais fora do musical - há uma canção original - mas é preciso salientar que essa escolha foi feita.

O que Hooper trouxe de novo a esta adaptação - e ainda bem que o fez - foi o facto de colocar todos os actores a cantar ao vivo, não havendo qualquer dobragem posterior. Foi uma escolha que funcionou muito bem a nível dramático, há toda uma nova genuinidade que se consegue desta forma. Nesta escolha optou-se também por transpor toda a carga dramática nas cenas musicais. Aqui quando as personagens sofrem isso é bem patente na interpretação, temos vozes que fogem e choram propositadamente. E neste sentido é preciso salientar a monstruosa interpretação de Fantine por Anne Hathaway. Uma cena absolutamente estrondosa e interpretada de uma forma nunca antes vista, pois no musical mesmo tendo a música ao vivo, há sempre uma preocupação em a canção não falhar (faz sentido). Este é sem qualquer dúvida um dos momentos mais altos do filme, que merece ser apreciado nas melhores condições.


Hooper, preocupa-se muito em mostrar toda esta emoção e talvez por isso a sua câmara esteja sempre muito próxima dos actores durante as interpretações, como se não quisesse arriscar-se a perder um momento que seja desse sentimento ou para não nos obrigar a virar-mos os olhos nos momentos de degradação também. Estes não foram, afinal de contas, os anos dourados franceses.

Voltando ao elenco, tem-se discutido as opções por actores de Hollywood em prol de actores ligados ao musical. Realmente quando Hooper privilegiou escolhas do musical, os resultados foram sempre certeiros, veja-se a prestação de Samantha Barks no papel de Éponine e Daniel Huttlestone como Gavroche, ambos excepcionais. Mas, viremos-nos agora para as escolhas Hollywodescas.

Quanto aos protagonistas, sobre Hathaway não me alongarei mais, ela tem aqui uma das prestações da sua carreira e pode não ser a melhor cantora dos temas, mas a sua bela voz aliada à sua representação da personagem, arrebatam-nos por completo, ela despe-se da sua pessoa e entrega-se a Fantine de corpo e alma (afinal falei mais um pouco). Hugh Jackman já tinha dado provas do seu talento, tanto a nível musical como dramático - quem viu "The Fountain" saberá do que falo. Da sua parte não houve portanto surpresas, o seu Jean Valjean é tudo que devia ser, inspirador e com uma belíssima prestação. Sei que houve quem não gostasse dos cortes nas canções, mas fizeram todo o sentido no filme e Jackman é outro dos que captura tudo isso muito bem.

Surpresas foram o duo Eddie Redmayne como Marius e Aaron Tveit como Enjolras, as caras da possível revolução, as caras de uma juventude à procura de uma nova França. Ambos foram excelentes surpresas a nível musical, dotando os temas em que participam de uma grande vivacidade que em nada perdem para os do musical. Ando a cantarolar "Red and Black" e "Empty Chairs At Empty Tables" a semana toda. Sacha Baron Cohen e Helena Bonham Carter num registo mais cabaret e cómico trouxeram alguns dos momentos mais bem humorados a interpretar o terrífico casal Thénardier. Cohen que vem de um tipo de comédia diferente, tem cada vez mais consolidado a sua carreira em Hollywood com papéis em "Sweeney Todd" e especialmente em "Hugo". Aqui, curiosamente, é aquele cujo sotaque mais se assemelha ao francês.


De todos Russel Crowe tem sido o que recebeu críticas mais duras no seu desempenho de Javert. Ninguém duvida das capacidades de representação do Gladiador, porém, em relação aos seus dotes vocais a conversa é outra, e havendo tantas escolhas disponíveis, porquê Crowe? Antes de continuar quero aqui confessar, que eu gostei de o ouvir, é certo que há vários intérpretes de Javert que cantam muito melhor, mas gostei do tom da sua voz nesta personagem, um tom diferente do clássico dos musicais e mais rockeiro, veja-se a excelente introdução ao filme, numa cena poderosa centrada em Valjean e Javert. O actor não terá carreira como cantor, mas gostei de o ver no filme - tem é de se manter nos graves. De qualquer das maneiras, e nem era preciso sair de Hollywood, vejo o Gerard Butler como uma melhor escolha para Javert. Ele deu provas em "The Phantom of the Opera" de Joel Schumacher que sabe cantar e tem o tal timbre rockeiro que vejo assentar muito bem em Javert.

Quanto a Cosette foi muito bem interpretada na sua fase de inocência por Isabelle Allen e posteriormente por Amanda Seyfried que cumpriu o que lhe era proposto.

Temos aqui um grande épico sobre uma altura conturbada para a França, que via o seu povo nas condições mais miseráveis, após o império de Napoleão. No centro, temos a personagem de Jean Valjean, preso por ter roubado um pão e que após 19 anos de martírio, encontra na acção de um bispo, a sua redenção e uma nova vida (Trevor McKinney ficaria orgulhoso). A bondade pode por vezes ser recompensada, mas não é o caminho fácil da vida, o verdadeiro altruísmo, onde abdicamos de nós pelo bem dos outros é dos sentimentos mais louváveis, mas também dos mais difíceis. Valjean é uma inspiração, atente-se, por exemplo, na sua relação com o seu némesis. Nunca em nenhum momento ele culpa Javert pelas suas acções, vendo-o antes por aquilo que ele é, um filho da sua época e realidade, alguém que crê fortemente nas suas convicções, mesmo que estas estejam, infelizmente, erradas.

[SPOILER - se tal é possível na história dos Miseráveis]

E é essa a lição que Javert recebe, uma lição que ao lhe destruir toda a moral pela qual viveu, lhe destrói, por conseguinte, a vida também.

Encontro com Sama - Hoje na FNAC de Santa Catarina


Hoje, quinta-feira, o autor de BD Sama estará presente no Fórum FNAC de Santa Catarina pelas 18 horas. Após a sua passagem pelo festival da Amadora no ano passado, o autor Brasileiro visita agora a Invicta.
Deixo-vos a apresentação do autor que pode ser encontrada na site da FNAC.

Tal como o Dr. Jekyll e o Sr. Hyde, Eduardo Filipe e Sama ocupam o mesmo corpo. Oriundo do Brasil, passou pela televisão, teatro e cinema como ator e realizador e por salões de Arte Contemporânea e Bienais internacionais, onde ganhou alguns prémios. No Fórum Fnac fala-nos sobre a produção autoral de BD, tendo como exemplo os seus livros, A Balada de Johnny Furacão (2011) e o Cadernos do Sama, vol I (2012).

Eu aproveitei a sua passagem na Amadora para adquirir além da "Balada de Johnny Furacão" um dos seus Cadernos personalizados, aqui fica uma foto:


terça-feira, janeiro 15, 2013

Rorschach #3 - Quando a BD e o Cinema se encontram


Quando "Before Watchmen" saiu algumas capas chamaram-me instantaneamente a atenção, uma delas a de Rorschach #1. Já falei do trabalho de Lee Bermejo, que nesta série volta a demonstrar os seus grandes talentos. Já agora aproveito para mostrar também a capa do #2 aqui.

Terminado de ler o #3, tive de o mencionar imediatamente aqui por duas razões. A primeira porque a capa volta a ser uma daqueles imagens que deve ser espalhada aos sete ventos e a segunda porque na história de Brian Azzarello, Rorschach tem um encontro com o mítico taxista Travis Bickle de "Taxi Driver". A personagem da BD já havia sido comparada ao célebre taxista interpretado por Robert de Niro, e agora, pela primeira vez, encontraram-se.

Até agora tem sido uma história bastante curta e rápida, mas com a intensidade típica da personagem. Depois do final - já esperado - deste 3º capítulo, promete-se um final sangrento. Mais uma vez é caso para dizer there will be blood.

The Crow: Skinning the Wolves #1


"The Crow" é uma obra que dispensa apresentações, onde a grande maioria já passou, certamente, a vista pelo seu nome. A obra nasce na BD pelas mãos de  James O’Barr, que o escreveu e desenhou após a morte da sua namorada (por atropelamento). Sabendo disto compreende-se melhor a dor que está embutida neste trabalho, onde James O’Barr usou a história de Eric Draven para confrontar os seus próprios demónios. Todo o livro é um processo de luto e por isso, mais do que o argumento em si, é a emoção que transborda das suas páginas que nos marca para sempre. Metaforicamente é como se "The Crow" tivesse sido desenhado em sangue.

No entanto, não seria graças a esta grande peça de BD, que o nome da obra alcançaria fama mundial. Tal deveu-se ao filme de culto dos anos 90 realizado por Alex Proyas. Filme que além da qualidade, também ficaria conhecido por ser o último de Brandon Lee que, infelizmente, morreu durante as filmagens. Seja na Bd ou em Cinema, "The Crow" ficaria sempre ligado à morte, tanto na ficção como na realidade, e isso conferiu - ainda mais - uma certa aura negra e tenebrosa à obra.

Como tudo que tem sucesso se tenta repetir (para mal de muitos pecados), também "The Crow" ganhou várias sequelas na BD e no Cinema, tendo direito até a uma série de TV. Tirando a série seriam todas novas histórias, pegando na mitologia criada e aplicando-a a outras almas sofredoras que não a de Eric Draven. Na BD não segui nenhuma, mas no cinema ainda vi o segundo, ficando-me por aí. Não tenho ideia das críticas das BD's, mas quanto aos filmes, digamos que ninguém fala deles ao contrário do original de Proyas.

Tudo isto para falar da nova abordagem de "The Crow" na BD, este "Skinning the Wolves", que me captou a atenção por se tratar do regresso de James O'Barr à obra que o consagrou. Desta vez O'Barr alia-se, no argumento e desenho, a Jim Terry, para contar a história de um novo "Crow", desta vez situada algures na segunda guerra mundial. A escolha da acção será uma das mais óbvias, quando pensamos em almas torturadas que deveriam regressar em busca de vingança, um dos nomes que nos vem automaticamente à memória é o do holocausto. Infelizmente, há muitos outros períodos negros da história, que poderiam figurar igualmente neste quadro e que não devem ser esquecidos. Não pretendo - de longe - criticar a escolha, até porque histórias destas nunca são demais, porém, queria salientar que existem outras situações desumanas além dos campos alemães que me parecem muitas vezes esquecidas. Nem saindo do tema dos campos de concentração, porque não relembrar mais vezes os campos russos de Estaline? ou os actuais na Coreia do Norte?

O que estranhei mais neste regresso foi o facto de ser um muito breve, "The Crow: Skinning the Wolves" contará apenas com três comics, o que me parece pouco, principalmente após a leitura do primeiro. É uma introdução interessante, mas rápida, dando a sensação que ainda poderá haver tanto para contar. Claro que isso só poderei confirmar no final. Comentar apenas um comic é ingrato, são poucas páginas e ainda tanta coisa pode acontecer, é preciso dar tempo ao autor para desenvolver a sua história, por isso o texto prende-se mais em dar a conhecer o livro e em aproveitar a oportunidade para falar de uma obra que gosto tanto.

De qualquer das maneiras parece-me uma proposta interessante, pelo menos para os fãs da mitologia, além de que este primeiro capítulo voou num piscar de olhos à minha frente, deixando-me curioso em saber mais.

Espreitem a capa alternativa aqui, que está bem bonita.

segunda-feira, janeiro 14, 2013

O Bairro: O Senhor Valéry


O senhor Valéry era pequenino, mas dava muitos saltos.
Ele explicava:

– Sou igual às pessoas altas só que por menos tempo.

Mas isto constituía para ele um problema.
Mais tarde o senhor Valéry pôs-se a pensar que, se as pessoas altas saltassem, ele nunca as alcançaria na vertical.
E tal pensamento desanimou-o um pouco. Mais pelo cansaço, no entanto, do que por esta razão, o senhor Valéry um certo dia abandonou os saltinhos. Definitivamente.
Dias depois saiu à rua com um banco.
Colocava-se em cima dele e ficava lá em cima, parado, olhando.

– Desta maneira sou igual aos altos durante muito tempo. Só que imóvel.

Mas não se convenceu.

quinta-feira, janeiro 10, 2013

Anna Karenina


Mais do que um dos filmes do ano, queria que "Anna Karenina" fosse um dos melhores filmes de sempre... não é, provavelmente nem do ano. Mas, também não é nada mau.

Joe Wright deslumbra-nos logo ao início ao nos revelar que utilizará os artíficios de um grande teatro para narrar esta história. Esta opção estética funciona maravilhosamente, tanto a nível visual, como também, enquanto analogia a esta sociedade Russa (funcionaria para outras igualmente bem).

O Conde Vronsky (Aaron Taylor-Johnson) - é mesmo o miúdo do "Kick Ass"? - foi sincero quando disse a Anna Karenina que não haveria paz para os dois, apenas miséria e a maior das felicidades. Vronsky arrebata por completo Karenina, fá-la experenciar emoções que nunca julgou possíveis e com uma intensidade que nos fazem questionar se ela algum dia teve uma escolha. Infelizmente, a dada altura, o filme perde alguma força, afastando-o de patamares mais elevados - mesmo que a intenção estivesse lá. Ainda assim são vários os momentos de brilho a destacar, como a primeira dança entre os dois, ou a corrida de cavalos. Julgo também que há uma expressão que me parece muito bem conseguida por Aaron Taylor-Johnson no trailer do filme, mas que, infelizmente, não foi o take escolhido para a peça final.

De salientar também Jude Law, impecável como Karenin. Um homem político e religioso, com uma reputação que o precede e que se vê mergulhado num mundo repleto de emoções, onde a maior parte delas, não são nada fáceis de digerir.


Contudo, há vida além deste romance, a história de Levin (excelente Domhnall Gleeson) - é mesmo um dos gémeos do Harry Potter? - é de igual importância e sempre que a sua personagem surge no ecrã o filme ganha novo fôlego. É capaz, também, de - juntamente com Alicia Vikander - ter a cena mais romântica de todo o filme.

Há ainda o irmão de Karenina, um divertídissimo Matthew Macfadyen, cujo próprio casamento seria também ele um alvo importante de análise, uma outra visão sobre o grande tema do filme, mas cuja passagem é breve. Imagino que no livro estes dois arcos mencionados devem ser muito mais explorados, afinal de contas o livro não está restringido por 2 horas.

quarta-feira, janeiro 09, 2013

Batman: Through The Looking Glass & Death By Design

Se há personagens que dispensam apresentações, Batman é uma delas. Criado em 1939 por Bob Kane e Bill Finger, rapidamente se tornou um dos maiores heróis do género, influenciando uma série de futuros personagens.

São vários os autores que querem escrever pelo menos uma vez o Homem Morcego. Além da sua linha de comics tradicionais, são várias as graphic novels publicadas sobre o mesmo, muitas das quais livres das amarras da cronologia oficial. Veja-se o caso de "The Dark Knight Returns" de Frank Miller, um dos melhores livros do Morcego que não pertence à cronologia oficial da DC. Já "The Killing Joke" de Alan Moore e Brian Bolland, apesar da mudança drástica que trouxe a uma personagem em particular, foi englobada nessa continuidade. No fundo, oficial ou não, as graphic novels do Batman foram tornando-se algumas das minhas leituras predilectas, fortificando a minha predilecção pelas suas histórias.

Devido a essa liberdade com a personagem, surgiram algumas ideias bem interessantes e que exploraram a personagem em diferentes aspectos. O já mencionado "Dark Knight Returns" trouxe-nos um Batman velho que havia-se reformado há muito; "Black and White" por sua vez usou o morcego para contar histórias de 8 páginas a preto e branco, num estilo noir que em Batman faz todo o sentido. São várias as ideias que surgiram e continuam a surgir para escrever Batman, e valorizo muito mais esta procura por algo diferente do que as inúmeras repetições onde se conta a mesma história vezes e vezes sem conta.

No ano passado, saíram estas duas BD's, que podem não ser as melhores histórias de Batman, mas que valem a pena conhecer pela forma como, mais uma vez, experenciam com a personagem. Além disso nunca darão o tempo por perdido, porque a nível gráfico são soberbas.


Through The Looking Glass



E se o mundo de Bob Kane se misturasse com o de Lewis Carrol? "Through The Looking Glass" é uma divertida amálgama entre Gotham City e o país das maravilhas escrito por Bruce Jones e com desenho e cor de Sam Kieth.

A fim de contar uma história destas, o autor usou as drogas como utensílio (não nele que eu saiba). Ao Batman ser envenenado, começa a ter delírios com uma jovem menina loira (Alice) que o guiará em torno de um estranho mistério. Durante a viagem de Batman e Alice (que Bruce teima em chamar de Celia), Gotham funde-se - na sua mente - temporariamente com o país das maravilhas, bem como as suas personagens.

Esta não é de todo uma típica história de Batman, mas antes uma divertida e alucinada experiência carregada de referências à obra de Carrol. E claro, numa história que envolva a obra de Carrol, já sabemos qual o vilão que Batman terá de enfrentar.

Toda este delírio ganha vida sob o lápis de Sam Kieth, um desenhador com um estilo irreverente e que adoro. Fabuloso o trabalho de Kieth a recriar esta amálgama, incorporando traços das personagens do país das maravilhas nos cidadãos de Gotham. Para os fãs de Kieth ou de Carrol é uma peça obrigatória.





Death By Design



Chip Kidd é mais conhecidos pelos seus trabalhos como designer gráfico - contando com várias capas de BD no seu currículo, bem como os seus trabalhos à volta da BD (Peanuts: The Art of Charles M. Schulz', 'Mythology: The DC Comics Art of Alex Ross', 'Batman: Animated', etc.). Em 2001 lançou o seu primeiro romance (The Cheese Monkeys) e no ano passado escreveu pela primeira vez uma graphic novel intitulada "Batman - Death By Design". Nota-se logo pelo tema do livro que o escritor tem uma forte ligação à arquitectura, que aqui serve como base para toda a história.

Para esta história o autor inspirou-se em dois eventos reais, na demolição da estação original da Pensilvânia em 1963 e no terrível acidente em Manhattan no ano 2008, onde um guindaste colidiu com um edifício em construção. Kidd começou a basear-se na possibilidade de ambos os eventos estarem ligados e como seria se tivessem ocorrido em Gotham City numa era de ouro.

A história em si não tem nada de virtuoso, mas é bastante competente, colocando questões pertinentes sobre a política em torno das grandes construções. Num livro cuja base é a arquitectura, obviamente que o grande foco é dado à cidade, e Gotham City é tanto uma personagem em "Batman" como Alfred ou Selina Kyle. Desta vez o enredo gira à volta da estação de comboios Wayne, um edifício mítico que faz parte do legado de Thomas Wayne e que o seu filho está agora prestes a substituir. Bruce tem as suas razões, mas talvez não conheça todas as peças deste tabuleiro, pois Batman está mais preparado para proteger a cidade do que para construí-la. Além disto ainda podemos contar com a participação desse caos vivo que dá pelo nome de Joker.

No entanto é a nível do desenho de Dave Taylor que "Death By Design" surpreende. O trabalho a grafite de Taylor e o seu retrato de Gotham City com especial ênfase na construção dos prédios é arrebatador. Uma peça exemplar.

terça-feira, janeiro 08, 2013

David Bowie - Where Are We Now?



Após um longo silêncio (10 anos sem lançar um disco) o Camaleão está de regresso. Bowie comemora assim o seu 66º aniversário com o lançamento deste single. O álbum "The Next Day" está agendado para 12 de Março. Teremos digressão a passar por cá? (faço figas até com os dedos dos pés).

É um dos artistas cuja carreira mais admiro, com um percurso tão notável como heterogéneo (não fosse a sua alcunha camaleão). Muitos parabéns Sr. Bowie e seja bem aparecido, tivemos saudades suas.

segunda-feira, janeiro 07, 2013

Holy Motors


Afasto-me do Cinema com um misto de entusiasmo e amargura. Amargura porque não tenho uma bagagem cinematográfica tão ampla que me tenha feito reconhecer as obras visitadas por Leos Carax, aliás, este é o meu primeiro filme do realizador. Não é algo que deve ser encarado como um obstáculo para o ver, apenas me pareceu que perdi qualquer coisa ao não ter reconhecido o M. Merde ou ao não saber que o casal que surge perto do final é o mesmo de "Les amants du Pont-Neuf", bem como a máscara usada por Edith Scob no final, entre outros pormenores. Essa amargura rapidamente vai desaparecendo à medida que me afasto do Cinema, mas com o filme ainda bem presente na mente. Se uns vão revisitar a obra do cineasta ao ver este filme, eu vou descobri-la, e posteriormente rever novamente "Holy Motors", em busca dessa sensação de saudosismo à qual não tive direito.

Como disse "Holy Motors" é uma viagem pelo Cinema, onde este se mistura com a própria vida, a ponto de não sabermos onde termina um e começa o outro. É o próprio realizador a interpretar "Le dormeur" (nome por qual é apelidada a personagem) e a descobrir um portal em sua casa, portal esse que nos transportará a todos para o Cinema e para experienciar algo singular.

A imagem segue para Oscar (Denis Lavant), o protagonista, que utiliza uma limusina não só como transporte, mas como camarim também - Juntemos o filme ao último de Cronemberg e temos aqui o carro do ano. Oscar trata-se de um actor, um actor em tempos modernos onde as câmaras quase invisíveis substituíram as gigantes clássicas. Algo amargurado com a situação actual dos tempos, Oscar continua na mesma o seu trabalho, acreditando que ainda tem público, que ainda é observado, mesmo que tal nunca seja comprovado.

É um filme fora do vulgar, tanto experimentalista como surreal. Não tem uma estrutura narrativa linear e não está minimamente preocupado com isso. "Holy Motors" abre-nos a porta da sua limusina convidando-nos para um passeio e a abertura que temos para o mesmo cabe-nos a nós exclusivamente. Se aceitarmos o convite, livre de tabus e preconceitos, podemos apreciar uma viagem com alguns momentos de verdadeiro esplendor. Dei por mim a ansiar pelos próximos trabalhos de Oscar sempre na expectativa do que se seguiria e para que novo mundo nos transportariam agora, pois o leque de papéis e sequências é tão diverso como distinto. Quem se esquecerá do segmento grotesco do já mencionado M. Merde, ou da expressão corporal em motion capture? Dois exemplos do que do melhor se pode encontrar nesta peça.
De salientar Denis Lavant que volta a trabalhar com o realizador para nos brindar com uma das representações do ano.

Havia qualquer coisa de "Divine Comedy" na canção protagonizada pela personagem de Kyle Minogue - numa bela cena. Daí que quando vi o nome de Neil Hannon como um dos responsáveis pela sua composição (a par do realizador) tudo fez sentido.

Por uma definição justa de pirataria


A pirataria é um mal que paira sobre a Humanidade. Todas as semanas, navios de praticamente todas as nacionalidades correm grandes riscos de serem abordados por piratas somalis nos Mares Arábico e Índico. Enquanto isso é um atentado à integridade física de pessoas e um roubo de produtos físicos - e a também antiga contrafacção de artigos coloca em risco a vida ou a saúde das pessoas - os governos e entidades mais ou menos oficiais preocupam-se principalmente com um tipo de pirataria bem mais ofensivo ou perigoso: a democratização do conhecimento cultural, através da partilha de conteúdos digitais.

Os conteúdos digitais foram uma invenção da indústria. Dando variedade de formatos e portabilidade, tencionavam vender mais, mais depressa e com maior lucro. E tal como no tempo dos gravadores de VHS, os consumidores contornaram as regras. Se há vinte anos as revistas apoiavam o consumidor fornecendo capas e códigos para gravar à hora certa, agora são os próprios fornecedores de serviços televisivos a permitir a gravação e visionamento posterior com um mínimo de esforço. E isso é legal porque, apesar de os fabricantes de conteúdo não gostarem, como são empresas que o fazem pagam impostos, continua a ser negócio. Os consumidores agradecem o serviço prestado.

Vender DVD contrafeitos é ilegal. Porque nesse cenário não ganha quem faz o conteúdo, nem quem o vende paga impostos sobre o seu trabalho. O consumidor agradece pagar menos do que por um bilhete de cinema ou uma cópia oficial e, como os tempos estão difíceis, já sente que é justo cortar numa despesa “supérflua” como é o entretenimento. Disponibilizar conteúdos online equivale ao anterior porque, atingindo determinada escala, começa a arrecadar quantias consideráveis de dinheiro com a publicidade.

E se quem os coloca online não estiver a ter lucro, nem a roubar a ninguém? Esse era o caso do blog My One Thousand Movies. Os três mil filmes que tinha eram clássicos que não se encontram à venda nem passam na televisão. Pretendiam dar a conhecer o património cinematográfico da humanidade. Serviam para descobrir cineastas esquecidos e obras de culto, mas com pouca resolução para que ninguém se sentisse tentado a ficar com essa versão em vez de se dedicar a procurar no mercado convencional de importação uma versão melhor. Outra vantagem é que no My One Thousand Movies todos os filmes tinham legendas em português ou numa língua mais ou menos compreensível. Na importação não.

Dia 16 foi fechado pela Google sem qualquer aviso por incentivo à pirataria. Estamos a falar de filmes quase impossíveis de encontrar no mercado, que em nada rivalizavam com a versão comprada, se existisse uma, e que tinham no máximo uma centena de downloads provenientes de todo o mundo, não apenas de Portugal.

O que o My One Thousand Movies fazia era complementar (ou substituir) a missão da deficiente televisão pública de educar cinéfilos. Muitos bloggers recorreram a este repositório para rever um título acarinhado, ou, a partir do filme e da pequena resenha que o acompanhava, fazerem publicações com as quais muitas outras centenas de pessoas ficaram com vontade de descobrir um cinema marginal e esquecido.
Isto não é pirataria, é serviço público, e é preciso (re)definir o enquadramento legal adequado.

Se alguém errou no meio disto tudo foram as distribuidoras que não viram interesse em comercializar os filmes. Ninguém o pode ver porque não compensa comprar os direitos e fabricar para pouca gente? Sugeríamos que houvesse um videoclube online no qual, por um valor simbólico, se pudesse ver o filme contribuindo para a distribuidora.
A distribuidora não teria encargos com a manufactura de cópias físicas que ficariam a ocupar espaço em armazém.
Os consumidores exigentes encontrariam o que queriam imediatamente sem remexer em caixotes de promoções nas superfícies comerciais.
Os retalhistas não estão interessados em ter uma cópia única de milhares de filmes que poderão nunca vir a comercializar, mas estariam interessados em vender cartões pré-pagos de acesso a esse serviço, como fazem para as consolas. Se o preço fosse suficientemente baixo toda a gente poderia espreitar e talvez descobrir algo único.

Enquanto este tipo de serviço não existir, estaremos sempre dependentes da boa vontade, dedicação e cultura de pessoas como o autor do MOTM. Mesmo que achem que isso vai contra a lei. De todos nós, obrigado.

Signatários

Ana Sofia Santos Cine31 / Girl on Film
André Azevedo BD no Sótão
André Marques Blockusters
António Tavares de Figueiredo Matinée Portuense
Armindo Paulo Ferreira Ecos Imprevistos
David Martins Cine31
Eduardo Luís Rodrigues - EddyR Corner
Francisco Rocha My Two Thousand Movies
Gabriel Martins Alternative Prison
Inês Moreira Santos Hoje Vi(vi) um filme / Espalha-Factos
Johnny Kino - O Desconhecido do Norte Expresso
Jorge Rodrigues Dial P for Popcorn
Jorge Teixeira Caminho Largo
Luís Mendonça CINEdrio
Manuel Reis Cenas Aleatórias / TV Dependente
Miguel Lourenço Pereira - Cinema
Miguel Reis Cinema Notebook
Nuno Reis Antestreia
Pedro Afonso Laxante Cultural
Rita Santos Not a Film Critic
Samuel Andrade Keyzer Soze's Place / O Síndroma do Vinagre
Victor Afonso O Homem que Sabia Demasiado

domingo, janeiro 06, 2013

Apple Man


E pela primeira vez quis ter um Mac.

sexta-feira, janeiro 04, 2013

Supernada - Nada É Possível


A bela edição de "Nada é Possível" juntamente com o apelativo preço, tornou impossível a sua não aquisição. Esta atenção ao culto do objecto é sempre uma mais valia nos tempos digitais para quem quer vender CDs pela forma tradicional.

Mesmo que o CD vá eventualmente acabar - pois sendo já por si digital não terá a força do culto do Vinil - ainda sou dos que gosta de trazer CDs para casa.

Supernada, como já todos devem saber, é mais um projecto musical do grande Manel Cruz. Quanto ao álbum, que já tinha ouvido por alto, confirma-se como um belíssimo pedaço de Rock nacional.

quinta-feira, janeiro 03, 2013

O Sol Nasce Sempre (Fiesta)


Os loucos anos 20 na cidade das luzes - Paris - foram um período fervoroso em termos culturais e boémios, como tão bem Woody Allen lembrou no seu "Midnight in Paris". Para compreender o fascínio que Gil (Owen Wilson) tinha pela época em questão é essencial conhecer as obras dos respectivos artistas em questão. Dos vários que povoavam as ruas e cafés de Paris, há dois cuja relação entre eles me tem suscitado grande entusiasmo em conhecer, falo da célebre amizade entre F. Scott Fitzgerald e Ernest Hemingway.

"O Sol Nasce Sempre" ou "Fiesta" (título com que foi publicado em Londres) trata-se do primeiro romance de Hemingway, que até à data ainda só se tinha aventurado por contos curtos. Foi publicado em 1926, quatro anos depois da obra mais consagrada do seu amigo, "O Grande Gatsby". Em 1954, venceria o prémio Nobel da literatura, uma honra que passou ao lado de Fitzgerald. Os prémios, sejam eles quais forem, irão sempre passar ao lado de alguns dos maiores artistas vivos e tendo em conta que Tolstói, Proust, entre outros, também nunca o venceram, não se pode dizer que Fitzgerald esteja em má companhia, mas já estou a desviar-me em demasia do assunto.

"Fiesta" é um conto sobre a chamada "geração perdida", sobre a qual a primeira grande guerra teve um grave efeito. Hemingway através das suas experiências pessoais e conhecidos, conta-nos a história de cinco amigos expatriados que se encontram em Paris (alguns deles a viver) e que se aventuram até Pamplona em julho para o festival de São Firmino. O protagonista Jake Barnes , por exemplo, tem claras semelhanças com o autor, combateu na grande guerra, é um jornalista a viver em Paris e nutre um forte fascínio pela arte da tourada. Sobre a sua "relação" com a personagem Brett, pensei que poderia ser inspirada na dele com Agnes von Kurowsky, enfermeira que o tratou durante a guerra e por quem se apaixonou, mas não encontrei nada que o corroborasse, apenas que Agnes serviu como base para outras personagens de outras obras do autor.

Podemos dividir esta história em duas grandes partes, a que decorre em Paris - onde toda esta canalha se reúne, acompanhando-os durante o dia-a-dia parisiense - e a que decorre em Espanha, que se divide numa primeira parte mais relaxante - com a pesca como pano de fundo - e numa segunda mais ferverosa, os sete dias de fiesta em são Firmino, onde a tourada é a principal atracção. Jake, o protagonista, é um dos grandes apaixonados desta arte, nutrindo uma genuína atracção e respeito pela mesma, que não passa despercebida pela comunidade de aficcionados do género. É que para os espanhóis, esta paixão, dificilmente pode ser verdadeiramente sentida por outros e o facto de aceitarem Jake - um americano - como um deles, só enaltece a aficíón (paixão) da personagem. Claro que como tudo na vida, o que demora a ser construído, pode ser destronado em meros segundos e mesmo sem o autor o apontar com diálogos é mais do que notório os efeitos que o seu grupo de amigos tiveram na reputação de Jake em São Firmino.

Sempre nutri, e continuo a fazê-lo, um certo fascínio por determinados estilos de vida apelidados de decadentes e pelas suas hedonísticas buscas do prazer, tão bem acentuadas neste livro - começo agora a ver melhor de onde vem todo o meu entusiasmo com "Shame" de Steve McQueen. Não se trata de nenhuma ilusão em relação às mesmas, mas gosto de observar ou até sentir as consequências que determinadas escolhas têm nas nossas relações, gosto da intensidade das paixões e dos vícios, e da tristeza que lhes segue. A cena em que Jake acompanha a sua amada Brett para a deixar nas mãos do toureiro Pedro Romero - a personagem mais (única?) heróica da obra - é de uma intensidade avassaladora e um dos momentos maiores e mais dolorosos de "Fiesta". A personagem Pedro Romero ganha o nome em homenagem a um toureiro do séc. XVIII com o mesmo nome. Existe uma clara distinção na sua apresentação e na do grupo de amigos de Jake. Romero é muito mais genuíno e honrado, do que qualquer um dos seus amigos.

Gostei muito desta viagem, vou sentir saudades de Jake, Brett, Bill, Mike e até de Cohn, que, no fundo, é apenas um ingénuo. Claro que Jake, de todos, foi aquele por quem senti uma maior empatia, trata-se afinal de contas do narrador, daquele cuja mente se liga momentaneamente à nossa e tal como ele também eu sinto que é sempre mais fácil alguém mostrar-se forte de dia do que de noite ou que muitas vezes a base de uma forte amizade entre um homem e uma mulher, está num prévio amor desse mesmo homem, por essa mesma mulher.

O tradutor é um nome muitas vezes esquecidos nos livros, e tem, no entanto, um trabalho deveras desafiador, pois estamos a falar de muito mais do que traduzir palavras, estamos a falar de traduzir uma "voz". Não li "Fiesta" na versão original, por isso afirmar que se trata de uma boa tradução seria redundante. Contudo, quero salientar, não só, que gostei muito de ler esta versão de "Fiesta" mas também que o tradutor Jorge de Sena escreve um belo prefácio e o qual, eu pessoalmente, até teria colocado antes como posfácio.

Penso que "Fiesta" não é considerado o livro mais bem escrito do autor, até o próprio disse que o melhor que seria capaz de escrever foi "O Velho e o Mar" - livro que lhe daria o prémio Pulitzer em 1952. Porém, este é muitas vezes citado como um dos predilectos, pois a sua intensidade é absolutamente contagiante embarcando-nos numa viagem que dificilmente esqueceremos. O estilo de escrita jornalístico e moderno de Hemingway, tornou-se amplamente referenciado, nomeadamente, pelo facto de não expor todos os pormenores da história, deixando determinados aspectos "abaixo da superfície" da história, um estilo que ficou conhecido pela "Teoria do Iceberg" (ou da omissão). O final do livro, em aberto, foi por exemplo um dos momentos mais marcantes em que Hemingway usou esta abordagem. Algo que hoje em dia é relativamente comum, mas que na altura foi um marco.

quarta-feira, janeiro 02, 2013

Wolverine: Madripoor


O nono volume da colecção "Heróis Marvel" é dedicado a Wolverine, aquele que de entre os X-Men se destacou mais e que por isso mesmo ganhou a sua própria série a solo. Estava ansioso por chegar a este volume, pois foi nesta fase de "Madripoor" que eu conheci pela primeira vez este mutante com garras a saírem-lhe dos punhos e que se apelidava de Caolho.

O Wolverine é uma personagem fascinante e desde que surgiu pela primeira vez nas páginas do Hulk, seria uma questão de tempo até conquistar definitivamente os fãs. Uma questão de tempo e de Chris Claremont também pois claro, nome responsável por vários títulos dos X-men onde Logan figurou e brilhou. Posteriormente, quando os X-men foram dados como mortos para o mundo e viviam em clandestinidade, Claremont encontrou a solução que procurava para ter um título de Wolverine a solo. Durante esta fase Logan iria em determinados momentos teleportar-se - graças ao mutante Teleporter - até Madripoor onde teria as suas aventuras sem os X-Men.

Madripoor, capital de um principiado a sul de Singapura, é uma cidade fascinante onde a riqueza do séc. XXI se encontra lado a lado com a pobreza mais profunda do séx. XVIII. Nunca uma cidade foi tão díspar entre as suas classes, aliás, em Madripoor classe média é coisa que nunca se ouviu falar, e cuja existência não passa de um mito.

Neste volume temos as primeiras aventuras de Wolverine, nesta fase, escritas pelo já mencionado Claremont e desenhadas pelo também grande John Buscema. Apesar de em algumas vinhetas achar que Buscema poderia ter tido mais alguma atenção a algumas personagens, o seu trabalho em "Madripoor" é fascinante e remete-me para os meus primeiros anos de leitura da Marvel. Este "Madripoor" podia ser uma colecção aparte, não há uma história em particular que dá título ao volume, temos aqui o inicio da sérieonde outros volumes poderiam ser lançados a continuar a colecção.

A título negativo, o facto de não se terminar um arco narrativo. Algo que poderia vir num "Madripoor 2" por exemplo. Talvez ainda faltassem muitos comics e por isso não se podia preencher mais este "Madripoor", é uma decisão compreensível quando sabemos qual o objectivo do volume, ainda assim se há coisa que dá pena na BD é ficar a meio de algo.

Top TV

Aproveitar que já está feito para o TVD para divulgar o meu top 10 de episódios de 2012 (dos que me lembrei) e que pode ser visto aqui.

Aproveito também para meter o top 12 (conjunto) de séries do TVD, onde saliento que Sherlock apenas ficou a um ponto de Breaking Bad. Batalha renhida.

Ah e claro, o top melhor mulheres de 2012 também.