segunda-feira, setembro 30, 2013

Infinite Vacation


É de aproveitar o lançamento da compilação de “Infinite Vacation” pela “Image” - numa belíssima edição em capa dura diga-se de passagem – para relembrar estre trabalho escrito por Nick Spencer e com desenho e cor de Christian Ward.

Na realidade de “Infinite Vacation” mais do que a prova da existência de infinitos universos paralelos, existe a possibilidade de viajar entre eles. Como estamos perante uma realidade muito próxima na nossa (salvo esta pequena/grande excepção), não surge como surpresa que este tipo de viagens tenha escalado rapidamente num negócio - aqui o dinheiro continua a mover o mundo.
 
Uma vez que a viagem entre universos se tornou um negócio prolífico, qualquer pessoa desde que tenha a quantia certa pode ter acesso às suas vidas paralelas, seja para as visitar ou até mesmo comprar, caso estejam disponíveis para isso. Imaginem que se arrependem de uma decisão no passado ou que sempre quiseram explorar outros caminhos. Basta procurar numa respectiva aplicação se essa vida se encontra no mercado e em caso afirmativo podem adquiri-la à velocidade de um clique. Como referi, aqui o factor mais limitante é a conta bancária. E não se preocupem se mudarem de vida, a empresa responsável por estes serviços disponibiliza-vos toda a informação necessária para o vosso cérebro assimilar as novas memórias. Afinal de contas não convém tornarem-se médicos sem adquirirem os conhecimentos da profissão. As possibilidades como já perceberam - nem que seja pelo título - são infinitas.


É importante referir também que existem universos cujos desenvolvimentos são considerados demasiado perigosos para os outros, nomeadamente um onde todos na Terra são canibais. Para proteger a maioria, estes universos rotulados como prejudiciais são destruídos, ou como a equipa gestora destas actividades prefere dizer, são desdobrados e absorvidos pelos outros universos, continuando a existir dentro dos mesmos… pois, boa sorte com isso.

Embora exista uma variedade infinita de possibilidades, a história teria de centra-se em alguém e neste caso essa personagem em particular é Mark, um viciado neste tipo de viagens que tendo-se tornado um especialista nos explica rapidamente tudo que precisamos saber para compreender o funcionamento do serviço. O problema com Mark é que por mais que troque de vida acaba sempre na mesma situação: sozinho e num trabalho ao qual tem aversão. Há um constante vazio que ele não consegue preencher, porque não compreende que o problema não está no meio, mas nele. Aqui é impossível não sentir um certo paralelismo entre esta sociedade obcecada pelas viagens no tempo e a nossa obcecada pelas redes sociais – com o respectivo distanciamento, as aplicações informáticas no telemóvel são agora o ópio do povo.

Porém, as suas crises existenciais assumem todo um outro nível quando descobre que as suas outras versões estão a ser assassinadas ao longo do multiverso e tudo porque aparentemente estão à procura dele – especificamente dele. Como Mark diz, passamos uma vida toda à espera que nos digam no meio de tantos (ainda mais aqui) que somos especiais e agora que aconteceu não podia ter surgido da pior maneira. É preciso ter cuidado com o que desejamos.


A fim de descobrirem o mistério por detrás destes assassinatos um grupo de Mark’s começa a trabalhar em parceria, enquanto escondem o Mark protagonista no meio de um grupo de defensores da singularidade. Estes singularistas são um grupo activista contra a utilização do “Infinite Vacation” onde alguns chegam até a crer na existência de um universo onde não existem outros universos paralelos. Isto pode parecer completamente descabido a início, uma vez que existindo a prova de outros universos é impossível que exista um singular. Mas é precisamente aqui que o argumento de Nick Spencer começa a ser realmente virtuoso, explorando outros conceitos da física quântica, nomeadamente a célebre teoria do gato de Schrödinger e confiem, tudo funciona muito bem.

Associado ao mistério dos assassinatos surge uma das personagens mais horripilantes a ganhar vida nas páginas de uma BD, uma que aproveita as potencialidades de um multiverso para elevar o terror a todo um novo conceito de politicamente incorrecto e moralmente repreendedor.

Apesar da narrativa de “Infinite Vacation” ser uma injecção tão massiva quanto estimulante de ficção-científica e de estar polvilhada com rasgos de mistério e horror, não deixa de ser admirável que na sua essência este seja mais um retrato desse momento intemporal em que um rapaz conhece uma rapariga - e é tão simples quanto isso. Tudo desenvolvido com uma originalidade e imaginação invejáveis e que certamente irão distinguir este trabalho entre tantos outros.


Quanto à arte de Christian Ward funciona em perfeita harmonia com a históra de Nick Spencer. O desenhador utiliza um traço muito livre e estilizado coberto por cores vivas que dão um ar muito enérgico e psicadélico a estas aventuras que se prolongam ao longo de vários universos. Estamos perante um daqueles excelentes casos em que vale a pena admirar a simbiose entre a escrita e o desenho. Existem também páginas onde se utiliza uma composição fotográfica em contraste com o desenho. Estas cenas são correspondentes aos comunicados por parte dos técnicos que trabalham na “Infinite Vacation”.

Com este trabalho a “Image” volta a reforçar a ideia de que é uma das editoras norte-americanas mais atraentes da actualidade. E com ideias tão entusiasmantes como esta, só posso concordar com tal afirmação.

domingo, setembro 29, 2013

Ainda sobre Utopia


Esqueci-me de referir (mas já acrescentei ao texto) que adorei a particularidade de Alice dar Dostoiévski na escola, ver uma criança com cerca de 10 anos a discutir - muito bem - o "Crime e Castigo" foi muito engraçado. Esperemos que ela esteja numa escola para super-dotados, caso contrário estamos mesmo muito atrasados no nosso ensino.

sexta-feira, setembro 27, 2013

Utopia - Temporada 1


 Where is Jessica Hyde?

“Utopia” parece-me ter um dos mais imponentes pilotos de que me recordo. Que excelente forma de nos introduzir a esta série carregada de teorias da conspiração e que tem uma BD no centro de toda a acção. Eu não costumo largar uma série apenas pelo piloto, mas no caso de “Utopia” não há perigo nenhum disso acontecer, antes pelo contrário, desafio alguém a não querer continuar depois de o assistir. Logo aquele início na loja de BD, com Arbie e Lee, é de uma tensão capaz de gelar o sangue nas veias - particularmente porque envolve uma criança também -, e é uma cena tão bem executada que logo aí percebemos que estamos perante grandeza televisiva.

Um grupo de pessoas comuns com vidas bem distintas umas das outras, acabam por cruzar-se por terem algo em comum. Todos eles são fãs da BD “Utopia” ou se preferirem da novela gráfica “Utopia”. Toda a sua criação bem como interpretação está envolta numa aura de mistério. O seu criador aparentemente produziu-a quando estava num manicómio após a qual se suicidou. Há quem acredite que em “Utopia” se encontram muitos dos segredos do mundo, e não sendo um livro que atinja grandes índices de popularidade, a verdade é que tem um forte culto entre alguns leitores. Ora quando um deles afirma num fórum ter adquirido as páginas do volume 2 (nunca publicado) a curiosidade de alguns membros dispara.

O problema é que existe realmente verdade em “Utopia” e uma organização que dá pelo nome de The Network, também se encontra desesperadamente à procura desse manuscrito, matando sem dó nem piedade quem lhes aparecer pelo caminho. Assim, sem fazerem ideia no que se haviam metido, Ian, Becky, Wilson Wilson e Grant, passam de cidadãos comuns a pessoas procuradas e em constante fuga. Já agora, Grant deve ser das personagens criança mais fantásticas de sempre.

Enquanto Ian e companhia tentam desvendar o que se passa e como melhor agir em prol do mundo e deles próprios, muitas outras coisas se vão revelando e entramos naquele esquema de paranoia em que ninguém parece ser de confiança e mais vale estar prevenido em todos os ângulos e direcções. Em termos de teorias da conspiração “Utopia” sabe fazer o seu jogo muito bem.

Paralelamente temos a história de Michael, um secretário do ministro da saúde, que se vê envolvido numa teia de chantagens onde é “forçado” a ajudar os objectivos da Network. Mas Michael no seu âmago é um bom homem, a questão que se coloca é se terá forças suficientes para lutar pelos seus ideais ou se simplesmente se irá render à opressão da Network.

Os dois assassinos que procuram o manuscrito, os já mencionados, Arbie e Lee, são também personagens a destacar em especial Arbie, cujo passado vai sendo revelado ao longo da série sendo tanto uma surpresa para nós como para ele. De certeza que Arbie ainda terá muito a dizer nesta série.


São apenas 6 episódios no seu total, mas qualidade e quantidade nunca foram sinónimos. “Utopia” é tremendamente bem escrita (por Dennis Kelly), com uma realização e fotografia muito cuidadas e com uma banda sonora que ainda hoje me assombra a mente de vez em quando. Para mim foi uma das grandes descobertas do ano em termos televisivos e fico ansioso a aguardar pela segunda temporada (em 2014).

Em relação ao plano da Network, que optei por não revelar para o texto ficar livre de SPOILERS, é uma ideia “curiosa” e foca determinados problemas que o mundo se encontra a enfrentar. A Network mostra-se a agir com o objectivo de proteger o mundo, não olhando a meios para chegar aos seus fins - a lembrar uma certa personagem de Watchmen. Claro que este plano, além da componente desumana tem riscos severos e que até são apontadas na própria série. Além de nunca concordar com ele ainda o acho demasiado perigoso pois vejo um cenário que pode conduzir à extinção da raça humana se as coisas não correrem bem. O meu apoio está, portanto, com os protagonistas. Mas se o plano é realmente este – aqui já não me admiro de nada – confirmaremos na segunda temporada, para já tudo indica que sim.

Agora uma curiosidade geek que me apercebi quando via isto. Nathan Stewart-Jarrett é o actor que interpreta Ian nesta série. É curioso que na série anterior em que participava, “Misfits”, a sua personagem chamava-se Curtis. Unindo os dois nomes temos Ian Curtis, uma coincidência curiosa no mínimo. Adorei também a particularidade de Alice dar Dostoiévski na escola, ver uma criança com cerca de 10 anos a discutir - muito bem - o "Crime e Castigo" foi muito engraçado.



quinta-feira, setembro 26, 2013

Agents of S.H.I.E.L.D.: 1×01 – Pilot (ABC)


Já estreou a série "Agents of S.H.I.E.L.D." da qual irei falar regularmente no TVDependente. A primeira impressão traz um misto de sentimentos, há coisas realmente boas na série, como alguns momentos de humor e, claro, as referências à BD, o final do piloto é, nesse sentido, espectacular. Mas a equipa que se formou ainda tem muito a provar e parece-me ser o calcanhar de Aquiles. Felizmente parece que Maria Hill irá ser uma presença regular, o que é uma excelente notícia, para mim foi um dos pontos altos do episódio.

O comentário ao primeiro episódio já se encontra disponível aqui.

quarta-feira, setembro 25, 2013

The Legend of Luther Strode

 

No mês passado chegou-me finalmente a conclusão de "The Legend of Luther Strode" e com ela a confirmação de que foi uma desilusão em relação ao primeiro arco, "The Strange Talent of Luther Strode".

A mistura entre o registo super-herói (mais anti-herói neste caso) e o estilo gore funcionou bem da primeira vez e trouxe-nos uma personagem que, apesar dos lugares comuns, se destacava trazendo alguma diversão nova e distinta a um género tão explorado. Neste segundo arco intitulado "The Legend of Luther Strode" achei interessante a forma como iniciaram a história e da qual já havia falado aqui, ou seja, não se começou por seguir a personagem directamente dando-nos o seu ponto de vista. Ela apenas surgia ocasionalmente para nos mostrar uma imagem de alguém perdido nas sombras.

Como este número prometia, "The Legend of Luther Strode", trouxe doses massivas e sanguinárias de desmembramentos e mortes. O problema é que só trouxe isso. No anterior ainda houve espaço para criarmos alguma empatia por outras personagens, que mesmo não tendo sido assim tão grande, nos fez sentir algo quando estavam em perigo. Falo da sua mãe, de Pete e claro de Petra. Ora aqui não se criam laços, não há espaço para tal, sinceramente, nem há personagens para isso. Petra que anteriormente surgiu como a personagem mais interessante, aqui vai perdendo encanto a cada número que passa.

De salientar, porém, um convidado de honra, afinal de contas não é todos os dias que se vê o Jack The Ripper em acção. Mesmo assim foi só mesmo isso que vimos, acção e mais acção. E isso só por si aborrece.

Tradd Moore continua seguro no desenho e para quem gostou do que foi feito anteriormente irá continuar satisfeito aqui, é uma fartura de pancadaria. Também nas cores se mantém Felipe Sobreiro que com o leque de cores claras que usa dá um tom mais leve a toda esta violência. Gosto das cores de Sobreiro, acho que tem aqui um bom trabalho, mas também seria curioso ver a utilização de cores mais escuras, nomeadamente no sangue, que mudariam bastante o tom desta BD, tornando-a imensamente mais negra e terrorífica. Mas percebe-se a escolha pela via mais clara e não faria sentido mudá-lo nesta altura. Disse isto apenas por uma mera curiosidade, como referi gosto do que Sobreiro fez aqui.

Quanto às capas saliento neste post a minha favorita, que fala por si (é o Jack). Optei por colocá-la sem os títulos para se apreciar melhor o desenho. Imagem retirada do blog de Tradd Moore.




terça-feira, setembro 24, 2013

sexta-feira, setembro 20, 2013

Dog Mendonça e Pizzaboy pedem Finaciamento Público


Não é surpresa que cada vez mais as plataformas de financiamento público estejam a ser exploradas pelos autores. Claro que quando um livro como o do "Dog Mendonça e Pizzaboy" precisa de recorrer a isto, tal não é um bom sinal para o mercado português de BD.

Passo a explicar, não tenho ideia dos números, mas tenho ideia que os livros escritos pelo Filipe Melo têm sido das BDs, senão mesmo "a" BD que mais vendeu cá nos últimos tempos. Ora quando a nossa BD mais popular precisa de crowdfunding, tal prova que o nosso mercado é mesmo muito pequeno.

Claro que o mais importante é não cruzar os braços e no caso do Filipe Melo, ele e restante equipa parecem muito motivados para concluir esta trilogia que se intitulará "As Fantásticas aventuras de Dog Mendonça e Pizzaboy - Requiem" e por isso optaram por recorrer a este tipo de plataformas para o conseguir. Pessoalmente acho que ainda devia fazer mais umas aventuras pelo menos até chegar ao "As Estupendas Aventuras de Dog Mencondça e Pizzaboy".

Se quiserem ajudar podem consultar este site, como podem ver o bom humor do autor mantém-se até aqui - pessoalmente gosto muito da opção em que podemos andar de mão dada com um dos três criadores do livro. Pelo que tenho visto está tudo a correr bastante bem e penso que os autores conseguirão angariar o dinheiro proposto.

Passem também pelo blog do Geraldes Lino que revelou ontem imagens inéditas do novo livro.


quinta-feira, setembro 19, 2013

Calafrios! #1





O Filipe Azeredo do blog "A Filactera" teve a muito boa vontade de criar uma revista de BD dedicada ao Terror da década de 50.

O objectivo desta revista é o de divulgar em português algumas dessas histórias, desconhecidas para muitos de nós (eu incluido). As histórias em questão são curtas e da autoria de nomes como Alex Toth e Basil Wolverton. Azeredo também salienta que estas histórias saíram num tempo em que ainda não existiam essas malditas restrições impostas pelo Comics Code Authority.


Muitos parabéns ao Filipe Azeredo por esta iniciativa que conto que seja um sucesso. Para saberem mais passem pelo seu blog onde ele tem a revista disponível gratuitamente e em vários formatos.


quarta-feira, setembro 18, 2013

Orphan Black



SPOILERS

“Orphan Black” é mais uma preciosa sugestão relacionada com as melhores séries estreadas este ano. Trata-se de uma produção canadiana e americana, criada por Graeme Manson e John Fawcett.

No piloto somos introduzidos a Sarah Manning (Tatiana Maslany) uma jovem rapariga que decide regressar a uma cidade canadiana, cujo nome - acho mesmo - não é mencionado, para vir buscar a filha Kira que havia abandonado há 10 meses atrás - não deve ter nada a ver mas acho curioso que Kira em Japonês signifique assassino. Na estação de comboios Sarah encontra uma mulher fisicamente idêntica a ela, precisamente no instante antes de esta se atirar para a frente de um comboio. Instintivamente Sarah agarra na mala da suicida e foge. De forma a esvaziar a conta bancária da sua doppelganger, Sarah decide assumir temporariamente a sua identidade. Claro que trocar de identidade com alguém que acaba de cometer suicídio pode não ser uma boa ideia, afinal de contas convém descobrir primeiro as razões que levaram determinada pessoa a enveredar por esse caminho e rapidamente Sarah vai começar a perceber o porquê e no que se meteu.

Algo que nos agarra logo no piloto são as personagens, nomeadamente Sarah Manning e Felix Dawkins (Jordan Gavaris) – o seu irmão adoptivo. Estão bem construídas e começamos logo a ter interesse no desenrolar das suas vidas. De qualquer das formas mereciam sempre o benefício da dúvida nem que seja por ela usar uma t-shirt do álbum “London Calling” e por ele ter a palavra Rimbaud a decorar-lhe a casa. Apesar de viverem há bastantes anos no Canadá, convém referir que ambos são naturais de Inglaterra. No final do piloto ficamos a conhecer mais uma doppelganger de Sarah – de origem alemã – e a intriga começa a aquecer. É a partir de aqui que "Orphan Black" revela o seu lado de ficção científica em adição ao thriller dramático que é.

A explicação para tantas caras idênticas por muito que as personagens achem estranho é, realmente, a mais lógica: clonagem. Uma organização desconhecida tem vindo a criar clones e a monitoriza-los desde sempre, nunca interferindo nas suas decisões. Se estes clones não tivessem começado a ser assassinados talvez Sarah e outras como ela nunca se tivessem cruzado. Já agora foi um golpe fantástico o de colocar um dos clones como o assassino.

A facção que educou o clone assassino, Helena, do pouco ou nada que sabemos dela, parece ter claras associações à Igreja e trata-se de um grupo que considera a clonagem uma abominação perante as leis de Deus, ou assim nos dão a entender. Do outro lado temos o grupo da ciência, um grupo claramente avançado para o seu tempo, mas onde a ética parece não assumir um papel preponderante. Ainda não foi respondido qual é exactamente o objectivo destes clones, mas estará claramente associado ao neoevolucionismo, que na série é uma corrente que defende a evolução assistida e planeada pelo próprio utilizador. De qualquer das formas o "simples" facto de termos clones a crescer em diferentes locais parece-me ter o potencial para ser uma das maiores experiências científicas de sempre, senão a derradeira, em relação à questão DNA VS Ambiente (sobre este tema dedico alguns parágrafos no final). Em adição, como alguns clones se conhecem, a série acaba por abordar também os impactos da clonagem na identidade pessoal de cada um deles, outro aspecto, a nível psicológico muito interessante.

A série tem também uma abordagem muito actual, criando grupos de pessoas aderentes do movimento do neovolucionismo que misturam os seus conceitos com as novas tecnologias cibernéticas. Há todo um sub-grupo novo de pessoas, que será interessante conhecer melhor.


Algo que também é preciso elogiar é o enorme gosto em ver Tatiana Maslany a interpretar uma série de personagens diferentes. Há determinadas cenas como uma conversa entre ela e Helena em que por momentos nos desligamos e pensamos que estamos a ver duas pessoas diferentes. Claro que a maquilhagem ajuda muito, mas os sotaques, as expressões e maneirismos estão mesmo muito bons. De todos os clones considero a Cosima como o elo mais fraco, parece-me ser a que tem o tratamento mais superficial em relação às outras que estão melhor escritas, mas tal pode dever-se ao facto de estar mais familiarizado com o ambiente dessa personagem, por exemplo, numa cena em particular ela parece-me estar a ler os nucleótidos como se estivesse a ver quais eram usados, ora todos que estudam ciência sabem que só há quatro - um difere entre DNA e RNA. Claro que como a Cosima, juntamente com a Sarah, é a mais sensual (sim são todas a mesma actriz, mas há diferenças), por mim fica até ao fim. Por falar em sotaques, também é preciso salientar o trabalho de Jordan Gavaris não só pelo lado britânico que deu à personagem mas por todo o seu trabalho a criar a sua personagem.

No meio de tantos elogios fica um travo amargo no final. No último episódio constrói-se muita tensão à volta da mensagem codificada que se encontra no DNA dos clones e ao esta se descobrir não causa o impacto que é suposto. Mesmo que uma empresa tenha patenteado a clonagem isso não muda rigorosamente nada na vida das personagens, elas que não se iludam, nenhum tribunal vai considerar um ser humano como propriedade de alguém, clone ou não clone (sim não existem leis para algo que não existe, mas quero crer que estou certo aqui). Por isso fico ansioso, mas também apreensivo para ver como vão pegar nisto na segunda temporada, onde espero também obter mais repostas, nomeadamente em relação a Kira, que claramente parece ter algo “mais” nos seus genes.




DNA VS AMBIENTE



A forma mais próxima da ideal para avaliar a forma como o ambiente nos afecta é termos pessoas com o mesmo genoma a interagir em sítios diferentes, daí muitos estudos utilizarem gémeos (é como ter dois clones). Como é evidente estamos a falar de um produto de ficção sem rigor científico, mas como gosto de reflectir sobre este tema, vou pegar nas questões que a série já levantou nesta primeira temporada.

Rapidamente ao analisarmos os poucos clones que já conhecemos de Sarah, percebemos logo que todos são significativamente diferentes, até aqui nada de novo, a grande questão continua a ser, até onde o DNA condiciona as nossas escolhas mesmo em meios distintos? Veja-se Sarah e Alison, duas pessoas com personalidades tão diferentes mas que partilham numa determinada cena o mesmo maneirismo. Uma indução de que claramente há aspectos que são completamente alheios do meio-ambiente e directamente relacionados com a nossa hereditariedade.

No caso de Cosima até a sua orientação sexual difere das restantes, algo que dá ênfase a que a nossa orientação sexual pode estar mais relacionada com aspectos culturais do que biológicos (pessoalmente não descartaria os biológicos tão cedo como a personagem o faz). Por exemplo, no que toca à formação da orientação sexual em particular, não estando muito a par dos estudos desenvolvidos na actualidade, tenho ideia que ainda não existe uma conclusão definitiva e que actualmente a maioria crê tratar-se de uma combinação entre factores sociais e factores hormonais (logo genéticos), basicamente como tudo na vida quem somos é uma mistura de determinados factores. Há estudos que também dão muito ênfase ao ambiente uterino em que se encontra o feto, nomeadamente à epigenética. Neste aspecto em particular os gémeos seriam sujeitos melhores a estudar uma vez que o ambiente uterino é o mesmo.

Como deu para perceber hipóteses neste tema não faltam, há uma série de factores considerados importantes no desenvolvimento humano e a resposta a este tipo de questões poderá não estar em nenhum deles, mas antes em todos, e isto vale para tudo, para a eterna questão de quanto da nossa vida corresponde à liberdade de escolha ou à necessidade - todos nós até certo ponto estamos condicionados a comportarmos-nos de certa forma porque crescemos em determinado ambiente e porque nascemos com determinados genes.

Optei por colocar este texto no final porque achei que nele me estava a afastar do comentário à série que até tem mais de thriller do que de ciência. Mesmo assim queria frisar que o potencial num enredo destes é enorme e fico ansioso para ver como o continuarão a desenvolver. 

terça-feira, setembro 17, 2013

Vacuum Horror (Aspiração Horrífica)


Aaron Kaneshiro, mais conhecido por Aaron $hunga, é um ilustrador e cartunista natural de Honolulu no Hawaii. Actualmente vive em Oakland, California, onde, em adição aos seus trabalhos artísticos, se encontra a frequentar o curso de ciência da computação. No seu currículo conta com posters feitos para bandas locais e com algumas BD’s publicadas em revistas como a Decay, Lodaçal Comix (Portugal) e Electric Ant.

A abordagem delirante e infame de “Vacuum Horror” valeu-lhe uma aura de culto ao longo dos anos desde que foi publicada no extinto site "uranium cocktail". Há alguns anos foi, finalmente, publicada em papel pela editora portuguesa “MMMNNNRRRG”. Nesta edição privilegiou-se a língua original - o inglês - o que possibilita a um maior número de pessoas a compra deste exemplar físico, contudo, no final de todas as páginas existe uma legenda que contém todos os balões traduzidos para português, ou seja, não há desculpas linguísticas para a sua não aquisição. Para os interessados ainda existem exemplares à venda, basta consultarem o site da Associação Chilli com Carne (se se tornarem sócios têm um desconto de 50% nesta e noutras compras).

“Vacuum Horror” tem início com um temeroso anúncio na TV por parte do presidente dos Estados Unidos (que estranhamente parece ser o Abraham Lincoln). Segundo o mesmo no próximo dia toda e qualquer tipo de criminalidade será permitida durante 24 horas. Rapidamente percebemos que isto não é uma boa ideia, particularmente quando uma das personagens lança um olhar perverso para debaixo da saia da sua própria filha. Uma sociedade sem qualquer tipo de amarras morais e legais, onde cada um cria o seu conceito de certo e errado, pode ser uma visão assustadora e o autor aproveita isto para nos mostrar um dos piores cenários possíveis, levado – esperemos nós – ao extremo, pois que haverá pais capazes do que mencionei acima, infelizmente, não há dúvidas, agora que sejam nos números que esta história apresenta, esperemos mesmo que seja fruto exclusivo da ficção.

Com um grupo de pais mais preocupado em violar as filhas uns dos outros e com uma mãe que parece planear a morte do marido, a jovem rapariga que nos é apresentada no início parece estar condenada, não fosse a súbita participação activa do seu aspirador. Sim, um aspirador, esse objecto que usamos para limpar a casa, mas que aqui é também uma criatura viva, um extraterrestre. Apaixonado pela pureza desta jovem salva-a contra tudo e todos numa orgia de pancadaria e genocídio que deixará as suas marcas visuais no leitor. No fundo as funções de limpeza mantêm-se intactas, só que desta vez a sujidade aspirada é outra.


Não será uma história comum ou muito menos tradicional, quando os envolvidos são uma jovem e um aspirador, mas ”Vacuum Horror” no seu cerne acaba por ser uma história de amor e sobre as barreiras que por vezes se quebram para este triunfar. Como pano de fundo temos uma das mais severas e exacerbadas críticas ao lado negro da Humanidade, onde temas como o niilismo ou o meio-ambiente são explorados pelo autor – a dada altura parece que ouvimos o agente Smith e a sua comparação da humanidade aos vírus. Tudo isto contado de uma forma muito psicadélica e onde os elementos Kafkianos são uma constante desta realidade – porque é que um povo de aspiradores é liderado por um gato?

Esta BD tem sido comparada a um género de mangá, o Ero Goru, que consiste em BD japonesa erótica e grotesca. Neste caso o grotesco suplanta claramente o erótico. Entre as influências do autor, contam-se nomes como os de Katsuiro Otomo (“Akira”), Daniel Clowes (“Ghost World”), Suehiro Maruo (“How to Take a Japanese Bath”), mas também David Linch e no-wave Punk.

Para quem gosta de BD's provocadoras, sem qualquer tipo de limites, mas principalmente para os apaixonados pelo bizarro, deixo esta sugestão de uma curta mas, sem dúvida, inesquecível história.


segunda-feira, setembro 16, 2013

Only God Forgives (2013)


“Only God Forgives” surge-me como um filme fetichista, já “Drive” o era (faltam-me ver mais dele), mas nesse toda a estética dos anos 80, o mito do herói e a emoção que dele advinha compensavam muito mais a sua visualização. Neste último Nicolas Winding Refn continua a filmar aquilo de que mais gosta, polindo todas as arestas com o máximo de atenção e no fundo a fazer um filme para ele próprio, talvez até sem grandes preocupações com a audiência.

É por isso mesmo um filme de extremos. Quem partilhar dos gostos - ou fetiches - do realizador terá em “Only God Forgives” uma aposta mais segura, enquanto o resto provavelmente fugirá dele como o diabo foge do telemarketing. Como eu partilho algumas das paixões do realizador, sendo uma delas a estilização da violência, encontro aqui uma série de aspectos que me atraem, mas no final não lhe fico rendido como havia acontecido previamente. Desta vez era preciso mais.

Uma coisa ninguém pode criticar negativamente a Refn, toda a cinematografia e jogo de luzes estão feitos com uma atenção impressionante. Esta era uma das razões porque fiz questão em ver o filme na grande tela e nesse sentido não desiludiu. A banda sonora volta a marcar uma forte presença também, entrando numa bela comunhão com as imagens. A sequência do combate em particular é maravilhosa.

Em relação à personagem de Vithaya Pansringarm, o Lt. Chang, muito se tem especulado sobre a mesma que já foi apelidada de “Anjo da Vingança”, aquele que exerce a justiça divina (se estivermos a pensar na justiça do Velho Testamento). O realizador afirmou numa entrevista que tanto Chang, como o Condutor em “Drive” ou o guerreiro One Eye em “Valhalla Rising” são a mesma personagem, uma criatura mitológica que tem um passado misterioso e que não se consegue relacionar com a realidade porque ele é muito mais intenso e puro fetiche [1]. Existe aqui portanto uma dose de misticismo e culto à volta desta entidade que poderá continuar a surgir nos filmes de Refn. Acho que este lado da personagem se nota mais em “Only God Forgives” do que em “Drive”. Sabendo-o agora, posso olhar para o filme e vê-lo, mas quando o vi pela primeira vez tal nunca me passou pela cabeça. Já neste, Chang é claramente uma personagem que remete mais para tratamentos místicos, quiçá divinos - e agora o combate entre Chang e Julian faz muito mais sentido.

A personagem de Ryan Gosling, Julian, é particularmente estranha e o actor interpreta-a de uma forma por vezes tão apática que nos deixa quase sempre a questionar o que se passará dentro daquela cabeça. Quanto mais o filme avança, mais descobrimos ou especulamos sobre Julian, claramente alguém com uma infância traumática e que tem na sua mãe uma relação de amor-ódio que por vezes evoca sentimentos de incesto, sentimentos esses nunca confirmados, tal como grande parte da sua história. Será que a sua mãe conta a verdade quando fala do filho e do pai? Kristin Scott Thomas no papel de mãe é também um dos pontos mais fortes do filme com uma das interpretações mais memoráveis do mesmo.

“Drive” tinha um argumento minimalista e privilegiava sem vergonhas a forma ao conteúdo, era assumido. Porém, além da beleza estética “Drive” tinha uma emoção que transbordava a tela, que para mim fez toda a diferença. Em “Only God Forgives” o realizador já constrói uma história mais impregnada de simbolismos usando como pano de fundo a realidade tailandesa, mas o que compensa em história, perde em emoção, este é mais frio mais sisudo. E isso não tem de ser mau, o problema é que Refn parece, pela amostra, ser um realizador muito mais capaz a trabalhar a forma do que o conteúdo. É certo que há um plano desde o início, os símbolos expostos ao longo do filme caminham-nos para um determinado acontecimento em particular, um momento de redenção. E apesar de o filme ser visualmente aterrador, de ter uma aura de mistério que até certo grau é bem eficaz, chegados ao fim, no campo da história, fica a sensação de que o resto do filme pedia mais - até porque já vimos coisas melhores neste campo.

"Only God Forgives" parece ser assim uma espécie de encontro entre David Lynch e Alejandro Jodorowsky, mas um que não consegue ser tão intenso nem marcante como os filmes dos dois realizadores citados. Ainda assim há claro potencial em Refn que tem um domínio da técnica que impressiona e muito.

sexta-feira, setembro 13, 2013

Death Note vol. 6 – Toma Lá, Dá Cá


Com este 6º volume da série “Death Note”, intitulado “Toma Lá, Dá Cá”, a Devir chegou assim ao meio desta alucinante aventura. É de congratular a editora não só pela aposta em mangá mas, também, pela frequência com que este tem sido editado. O regresso da Devir às publicações de BD parece assim ganhar contornos cada vez mais seguros, nomeadamente no que toca ao mangá, tal como se pode comprovar com o início da publicação de “Naruto” e, igualmente, com a promessa de “Blue Exorcist” para um futuro muito próximo.

Até aqui tudo séries Shōnen (mangá direcionado maioritariamente ao sexo masculino dos 13 anos para cima), o que faz sentido se tivermos em conta que é o género de mangá mais popular. Porém, consoante a taxa de sucesso destas edições, talvez a Devir se arrisque por outros campos. Ainda assim, apesar de “Death Note” se encontrar nesta categoria, afasta-se dos restantes títulos mencionados por ter conteúdos mais maduros e que o aproximam do género Seinen (mangá direcionado maioritariamente ao sexo masculino entre os 18-30 anos), o que também poderá ter contribuído para o seu grande sucesso (é dos mangás mais vendidos no mundo) uma vez que tanto os habituais leitores de Shōnen como os de Seinen, poderão se interessar pela mesma. De qualquer das formas, o maior mérito do sucesso de “Death Note” prende-se com uma excelente premissa, cujo desenvolvimento tem sido do mais aliciante possível e, esse mérito, ninguém lho tira.

É de sublinhar que este texto, não desvendando o enredo deste volume, fará menções a acontecimentos passados nos antecedentes, sendo um texto direcionado a quem tem vindo a seguir os restantes capítulos. No volume anterior, o duelo entre L e Light havia assumido proporções tão hercúleas que algo teria de, obrigatoriamente, mudar na série. Depois de L nos ter proporcionado a maior reviravolta da história ao se revelar a Light (quem estava à espera desta?), a sua investigação começou a aproximar-se cada vez mais dos detentores dos dois cadernos da morte – Light e Misa. Da forma que a história estava a seguir, Tsugumi Ohba tinha de tomar uma decisão drástica: ou concluía este duelo de titãs ou, então, precisava de uma outra reviravolta – o autor optou pela segunda.


Em mais um desenvolvimento mirabolante – a como esta série nos tem bem habituado -, Light entrega-se a L, abdicando posteriormente da posse do caderno da morte e, por conseguinte, das suas memórias em relação ao mesmo. Claro que não o faz sem antes instruir o Shinigami Rem para entregar o caderno a outro humano, na condição de que este continue os seus julgamentos. Desta forma, com as acções de Kira a continuarem e com Light preso, L acaba por ver-se obrigado a libertá-lo, algo que não faz de bom grado.
Como Light já não possui as suas memórias enquanto Kira, estamos agora perante uma personagem substancialmente diferente e que tem intenções sinceras quando se voluntaria em ajudar na investigação de L. Foi uma decisão sensata e interessante, esta do autor, que, apercebendo-se que uma determinada linha narrativa tinha chegado ao fim e em vez de a esticar até ao aborrecimento, optou antes por outro tipo de mudança radical. Agora, L e Light trabalham juntos – mesmo juntos porque estão algemados um ao outro uma vez que L ainda desconfia dele – para apanharem o novo Kira que, pela primeira vez, tem uma identidade também misteriosa para o leitor.

Este volume trata precisamente da história referente à investigação do novo Kira, que já havia sido iniciada no final do volume 5 e que Light já havia focado nos líderes da empresa Yotsuba. Seguimos assim, ao longo deste volume, uma operação policial com resultados bem mais produtivos do que quando Light era Kira. Quanto ao novo Kira, não é de longe uma personagem tão interessante como Light, mas é uma que vale a pena conhecer para termos a imagem do que outra pessoa faria com o caderno; neste caso, alguém mais avarento que usa o caderno apenas para enriquecer à custa da vida de outros, um objectivo muito mais banal e mesquinho que o de Light, mas que vale a pena mostrar. Este Kira assume-se logo distinto, por exemplo, quando ameaça a vida dos políticos se estes continuarem a tentar capturá-lo, o que leva a retirarem a polícia deste caso, uma decisão que terá as suas repercussões na equipa de L.

Há medida que a investigação vai evoluindo, Ohba mostra-nos como sabe construir uma tensão em crescendo ao longo de cada capítulo, até atingir níveis fervorosos num fantástico clímax final. Como é típico no mangá, estamos perante uma narração visual muito dinâmica e, neste caso em particular, onde há sempre algo relevante a acontecer e a ser descoberto.

Tsugumi Ohba ficou conhecido mundialmente através de “Death Note”. Contudo, no caso do desenhador Takeshi Obata o caso é outro, pois estamos perante um autor que já gozava de um maior reconhecimento – reconhecimento esse que volta a ser justificado em “Death Note”. Obata tem um traço fluido e uma atenção à caracterização das personagens, que dão uma vida não só muito enérgica mas, também, pessoal a esta série. Mesmo que os Shinigamis sejam de certeza das personagens mais engraçadas de desenhar, sente-se sempre que Obata se diverte muito com L – quiçá o detective mais peculiar a pisar as páginas de um mangá – e isso é um sentimento que passa para o leitor.

Depois deste final fica a questão no ar: qual será o novo rumo que a série seguirá? E será que Light abdicou mesmo do seu plano de ser Kira? É algo que custa a crer, tendo em conta a sua personalidade. De qualquer das formas, as respostas terão de aguardar pela edição do sétimo volume que, se tivermos em conta o que tem sido feito até aqui, promete ser épico.


Notas:

- Publicado originalmente no site da Rua de Baixo;
- Um comentário à série completa pode ser lido aqui
- Comentários a todos os episódios da série de animé aqui.
- Um agradecimento especial à Devir pelo livro.

quinta-feira, setembro 12, 2013

Novo livro de David Soares e Pedro Serpa




David Soares tem construido uma sólida carreira tanto na Banda Desenhada como na literatura. É um nome que comecei a desobrir em BD na altura em que começou a ser editado pela "Kingpin Comics" com o álbum "Mucha" desenhado por Osvaldo Medina e com arte final de Mário Freitas. Um livro que me captou logo a atenção, uma vez que o género do Horror é algo que encontro pouco pela BD nacional. Posteriormente seguiu-se mais um pequeno conto com "o pEQUENO dEUS cEGO" desta vez com desenho de Pedro Serpa. Por razões distintas ambos os livros são bastante interessantes, mas com algo em comum, o facto de nos quererem fazer ler mais do autor, não só em termos de quantidade, mas uma narrativa mais longa também. Claro que temos sempre os seus livros de prosa para isso, mas esse é um campo no qual ainda não conheço o autor, ainda.








Além da qualidade da escrita, David Soares sobressai por ter criado um universo na BD - acredito que na literatura também - com uma forte identidade autoral. A sua escrita densa e carregada de simbolismo, aliada a temáticas obscuras e sombrias, reconhece-se rapidamente num livro seu, onde as influências de Alan Moore se fazem notar (imagino que não tenha sido ao acaso que foi escolhido para traduzir "A Voz do Fogo").

Numa vontade de conhecer mais do autor procurei obras suas mais antigas e li há cerca de uns meses duas publicadas pela sua extinta editora "Círculo de Abuso", falo de "Cidade-Túmulo" e "A Última Grande Sala de Cinema". Para minha grande surpresa ambas desenhadas pelo próprio (desconhecia essa sua faceta). Além das histórias gostei muito dos desenhos de Soares, que obviamente teriam de ser tão negros como a escrita. Ambos os livros estão carregados de mistério e são bastante aliciantes, mas a minha predilecção recai mais para "A Última Grande Sala de Cinema" (e aqui falo em relação a tudo que li dele). Um livro que alia o poder da BD à mitologia do Cinema e que pisca o olho a várias épocas históricas que o autor usa para criar falsas mitologias. É um livro muito forte onde demónios e Homens se encontram na... última grande sala de cinema.


 

 
Os desenhos de Soares adequam-se na perfeição ao tom da narrativa. Ora no caso de Pedro Serpa estamos perante um desenhador cujo traço é mais limpo e que substitui o preto-e-branco por um leque de cores coloridas dotando as BD's de um ambiente muito mais leve. Antes de continuar quero salientar que apenas conheci o trabalho de Serpa com "o pEQUENO dEUS cEGO". Uma vez que o desenho de Serpa é, à partida, bastante diferente dos ambientes criados por Soares, esta parceria podia anular-se uma à outra, mas não é o caso. É muito curioso ver o universo de Soares ganhar vida num registo como o de Serpa e daqui a poucos dias poderemos voltar a vê-lo acontecer.
 
"Palmas para o Esquilo" é o novo livro desta dupla que terá lançamento dia 14 de Setembro às 17H00, na loja da Kingpin em Lisboa (Rua Quirino da Fonseca, 16-B). a edição é, novamente, da "Kingpin" e a legendagem está a cargo de Mário Freitas. Trata-se de mais um conto curto com cerca de 56 páginas e o preço será de 10,99€.




quarta-feira, setembro 11, 2013

Arcade Fire - Reflektor



Em 2004 o mundo rendeu-se a "Funeral" o primeiro álbum da banda canadiana "Arcade Fire". O álbum foi considerado por vários críticos como o melhor desse ano. Além disso na lista dos melhores 500's de toda a História feita pela "Rolling Stone" encontra-se em #151 (uma lista que vale o que vale - nada - uma vez que não tem um único álbum dos Pink Floyd no top 40). Uma coisa era certa, não havia contestação que estávamos perante um dos projectos mais interessantes da actualidade.

A fama continuou a crescer e em 2007 a banda regressou com "Neon Bible". Quando a marca que um primeiro álbum deixa é tão grande, acredito que a relização do segundo tenha um nível de pressão assustador. Mantendo-se fiéis a eles próprios o sucessor de "Funeral" é um digno e que recebeu críticas positivas por todo o lado, mesmo não tendo sido elevado aos píncaros como o anterior. Nota-se também um amadurecimento da banda, um som mais coeso, a estrada faz sempre bem a um músico. Uma particularidade do álbum é que grande parte do mesmo foi gravado numa Igreja e a diferença em termos acústicos faz-se notar. "Neon Bible" pode não ser um álbum ao nível do seu anterior, mas também não tinha de o ser e surge como um álbum sólido e uma bela continuação.

Em 2010 chega "The Suburbs" e tirou quaisquer dúvidas que houvessem (não haviam) de que os Arcade Fire são uma banda para deixar o nome na História, além de um álbum ou dois. Tenho ideia que este terceiro projecto ainda recebeu melhores críticas que o anterior, elevando ainda mais o culto da banda. Foi na digressão deste álbum que vi o contagiante concerto que deram no Super Bockhttp://alternative-prison.blogspot.pt/2011/07/17-super-bock-super-rock-150711.html. Se em álbum a banda funciona, ao vivo não lhe fica atrás. A química entre banda e público é uma das que ainda mais recordo.

Agora este ano, a banda está de volta com "Reflektor". O single com o mesmo nome já circula por aí e é qualquer coisa de fantástico. Não só porque é um portento de canção, mas porque traz uns "Arcade Fire" bem distintos daqueles a que estamos habituados e aqui as influências de James Murphy na produção não passam despercebidas, os "Arcade" estão muito mais dançáceis. Isto poderá afastar alguns, mas eu gosto de uma banda que explora novas facetas que procura reinventar-se em vez de se remeter a um determinado estilo. "Funeral" existirá sempre para o admirarmos, bem como os restantes. Agora experimentos "Reflektor".

De salientar também a curta, mas marcante, participação de David Bowie na canção (ele que é um conhecido admirador da banda) e ao facto da realização do video estar a cargo de Anton Corbijn. Juntou-se aqui uma equipa de sonho e o resultado cumpre muito bem com as expectativas.

terça-feira, setembro 10, 2013

Blue Jasmine


A carreira de Woody Allen é qualquer coisa de impressionante. Em termos cinematográficos já realizou quase 50 filmes, escreveu ainda mais e a verdade é que por muitas diferenças de qualidade que existam entre uns e outros – e existem – nunca vi algo dele que considerasse mau. Um filme de Woody Allen, mesmo quando é menor, tem sempre aspectos de relevo e interessantes o suficiente para valer a pena a sua visualização.

Espero que este início não vos faça pensar que “Blue Jasmine” é uma das suas obras menores, nada disso, é um belo regresso do realizador, um regresso a um estilo mais teatral, onde os actores imperam liderados pela soberba Cate Blanchett. Allen sempre soube escolher a mulher certa para o papel certo e Blanchet em “Blue Jasmine” é uma estrela, daquelas que deixam uma impressão que fica connosco muito depois de já termos saído da sala de cinema.

A história é sobre uma mulher, Jasmine, cuja vida financeira foi facilitada ao se ter casado com um milionário. Infelizmente o tempo iria roubar-lhe tudo que tinha quando o seu marido foi preso por corrupção. Habituada a uma vida de luxo vê-se obrigada a ir viver para São Francisco com a sua irmã, que ao contrário dela tem uma vida completamente distinta e de classe média.

Após "Whatever Works" o realizador está também de regresso aos Estados Unidos, mais especificamente à cidade de São Francisco cuja arquitectura da ponte Golden Gate foi anos mais tarde usada na nossa "25 de Abril". Digam-lhe isto para ver se ele vem cá filmar. A música continua a ser escolhida a dedo com a peça "Blue Moon" de Richard Rodgers e Lorenz Hart a ter um destaque especial.

Conluindo, é Woody Allen e isso é razão suficiente para chamar qualquer pessoa ao cinema. Este homem escreve de uma forma maravilhosa misturando cultura e humor como poucos e num estilo muito próprio. Altamente recomendado pois claro.

domingo, setembro 08, 2013

A Liga de Cavalheiros Extraordinários está de regresso


 Não esta, mas esta. Só para dizer que os episódios da 5º temporada de "The League" voltarão a ser comentados por mim no TVDependente. O primeiro já se encontra disponível aqui.

quinta-feira, setembro 05, 2013

PAUS e The Divine Comedy (a solo) em Guimarães


Este ano no âmbito do festival Manta em Guimarães teremos PAUS a actuar já amanhã e Neil Hannon no sábado. Os concertos vão ser nos jardins do Centro Cultural Vila Flor e a entrada é... GRÁTIS!!!

Quem não morar lá perto pode sempre apanhar o National Express:

A Minha Vida é um Esgoto


"A Minha Vida é um Esgoto" se não estou em erro foi uma edição que surgiu a convite de João Paulo Cotrim, na altura responsável pela direcção da bedeteca de Lisboa. Nessa altura a bedeteca tinha uma colecção de BD sob o seu selo editorial que pretendia destacar determinadas obras de autores nacionais e o trabalho de Ana Cortesão foi um deles. A edição é também da "Baleiazul" em colaboração com a bedeteca. O livro foi-me, muito bem, aconselhado na bedeteca pelo Marcos Farrajota há uns meses atrás e não queria deixar de o mencionar por aqui.

"A Minha Vida é um Esgoto" trata-se de uma compilação de curtíssimos contos sobre a realidade portuguesa, tudo feito num tom satírico. O traço de Ana Cortesão é muito caricatural e encaixa em perfeita sintonia com a sua escrita de crítica social. À excepção da capa, todo o livro é a preto-e-branco. No fundo estamos perante um livro carregado de humor que se foca na realidade portuguesa e nas nossas particularidades enquanto sociedade.

Já não tenho o livro comigo e não me arriscando a cometer alguns erros, não me vou alongar mais sobre ele, ainda assim acho que é importante dar-lhe destaque porque me parece um daqueles tesourinhos que caiu no esquecimento, eu pelo menos não conhecia. Se o encontrarem ou passarem pela bedeteca, dêem-lhe uma vista de olhos, não vão ficar desiludidos. De resto é uma pena que Ana Cortesão esteja afastada da BD, é certamente uma autora a ter em atenção.

quarta-feira, setembro 04, 2013

Luther - Temporada 3

 

SPOILERS

"Luther" foi uma série que prendeu o interesse logo no primeiro episódio, aquele que nos introduziria à bizarra e apaixonante relação que se iria construir entre o detective John Luther (Idris Elba) e a assassina Alice Morgan (Ruth Wilson). A apresentação ao protagonista revela-nos que estamos perante um detective capaz, dedicado e com métodos de trabalho questionáveis no que toca à leitura da Lei. Logo na cena inicial do piloto Luther hesita ao salvar um assassino, acabando por o deixar morrer. Não restam dúvidas, há linhas que o detective está disposto a dobrar, como o futuro bem o reforçaria. No entanto, não tenham dúvidas em relação ao seu profissionalismo, Luther apanha sempre os culpados - a forma como o faz é que pode entrar em discussão. Depois existe aquela paixão por David Bowie, nunca me vou esquecer da cena em que vemos Luther a reflectir sobre um crime inspirando-se no mesmo método que Bowie usa para compor canções. Se a personagem já era interessante, este tipo de pormenores torna-a especial, única. Depois temos em Alice o seu par, que acaba por ter tanto de rival como de companheira, mas a ela voltemos mais tarde.

É precisamente nas personagens que "Luther" tem um dos seus maiores trunfos, razão pela qual nos conquista tão rápido. Além das duas já mencionadas, também os secundários são muito valorosos, seja o fiel companheiro de Luther, Justin Ripley (Warren Brown), o sempre prestável Benny (Michael Smiley) ou o superior Martin Schenk (Dermot Crowley) que trouxe mais do que parecia à primeira vista. Isto para não sair da terceira temporada, porque é impossível esquecer o antigo companheiro de Luther, Ian Reed (Steven Mackintosh) que nos mostrou como uma pessoa se pode perder em tão escassos minutos. Contudo, tenho a sensação que por muito boas que sejam estas personagens, foram sempre substituíveis, salvo a excepção do próprio Luther e de Alice. Prova disso é que a ausência de Alice após a primeira temporada, não só se fez sentir como nunca foi devidamente preenchida. Nunca mais conseguiram criar uma nova personagem feminina que estivesse ao mesmo nível - ou sequer lá perto. Na segunda temporada o elemento feminino introduzido era diferente, em vez de assumir conotações amorosas com Luther assumia conotações paternais, mas mesmo sendo diferente não conquistou e prova disso é a sua imediata ausência na terceira temporada. Aqui regressou-se ao interesse amoroso, que parecia vir dotado de algum mistério ao início - algo que se provou falso. No fundo Mary (Sienna Guillory) até poderia vir a ser relevante, mas fica a sensação que só existiu para servir de isco num determinado arco narrativo, é pena.



Outro aspecto muito competente na série prende-se com o ambiente que cria e a forma como este envolve o espectador, em particular o tom soturno com que os arcos narrativos são apresentados e que se tornaram uma das maiores imagens de marca da série. Ainda me recordo na segunda temporada daquele início na gasolineira, quando um homem, aparentemente comum saca de um martelo e começa a causar o pânico. Havia todo um toque realístico que contribuia para tornar as cenas ainda mais tenebrosas. Nesta temporada tivemos mais dois fortes inícios (são 4 episódios no total, mas duas histórias). No primeiro tivemos aquele suspense do clássico assassino que se esconde debaixo da cama e no segundo a entrada em cena de um vigilante, quando tudo parecia perdido para um casal a ser atacado.

Confesso que esperava mais do arco do vigilante, nomeadamente da personagem em si. Tom Marwood (Elliot Cowan) entra em cena como se de um Frank Castle (aka Punisher) se tratasse, mas estraga tudo ao matar Ripley. Mais do que a morte da personagem, o que me desiludiu foi que Tom quebrou o código do anti-herói ao matar um polícia, caíndo assim no leque de vilões - havia outras possibilidades, um tiro na perna por exemplo. É que Luther também estica a corda da moral e por isso seria interessante ter um desenvolvimento diferente entre estas duas personagens, que não partilhando dos mesmos métodos poderiam até certo ponto respeitar-se. Isso termina quando Tom mata Ripley, até porque o que custa mais é quebrar a corda a primeira vez, depois disso…

Claro que isto foi apenas uma expectativa minha, que aproveitei para desabafar. Tendo em conta a opção escolhida, o seu desenvolvimento foi bom, mas também muito graças ao tão aguardado regresso de Alice, o trunfo que haviam guardado na manga. Na cena final percebemos também que chegámos ao fim de "Luther", que os criadores deviam ter este momento final já guardado há muito tempo na memória, para quando decidissem fechar as cortinas, dando assim um aparente final feliz a estes dois. Que ambos partilham uma forte intimidade, não há dúvidas, mas Alice não deixa de ser uma assassina e por isso a questão se Luther largaria tudo para estar com ela sempre esteve no ar. Talvez o mais racional é que a resposta fosse negativa, mas, ou porque os sentimentos muitas vezes partilham pouco espaço com a racionalidade ou porque pura e simplesmente os criadores queriam este final feliz para o herói, não foi o caso.


A série termina, mas já se fala num filme para trazer de volta estas personagens. Incluindo Ripley (será uma prequela portanto). Normal, Ripley é daqueles que a morrer também teria de ser no final, a evolução da amizade entre ele e Luther foi muito bem construída e nesta temporada ainda mais colocada em prova, sendo o ponto alto da primeira história, uma que alterna entre a caça a um assassino em série e uma investigação ao próprio John Luther que parece não se conseguir livrar de constantes ameaças ao futuro da sua carreira e vida pessoal.

Foram poucos episódios, 14 no total, e mesmo que a qualidade não se meça em números, a verdade é que não me importava nada de aguardar por uma quarta temporada (o final desta teria de ser adiado). Por fim, uma palavra em especial para a prestação de Idris Elba. Para quem já viu "The Wire" é impossível não ser fã do senhor e em "Luther" teve um dos seus melhores desempenhos, que não será facilmente esquecido.